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A Administração Do Mistério - Volume 1

por T. Austin-Sparks

Capítulo 14 - 1. Judas – A Habitação de Satanás em sua Obra. 2. O Homem Celestial – A Habitação de Deus


Ler: João 13:21–33; Efé. 3:17–19; Col. 1:25–27.

Precisamos enxergar o Senhor Jesus em relação ao primeiro Adão, e a tudo o que surgiu por conta do que aconteceu ao primeiro Adão em sua queda, não apenas como isto tem referência ao homem e à sua condição, mas a tudo aquilo que o ato de desobediência de Adão deixou neste universo, e neste mundo. Este ato de desobediência abriu a porta junto a qual as forças do mal estavam à espreita, aguardando por um acesso. Adão foi a porta. Não fosse Adão, as forças do mal jamais teriam entrado, mas ele, por sua desobediência, abriu a porta e as forças do mal correram para a criação de Deus e assumiram uma posição de grande força, a fim de produzir nela um estado de coisas contrário a Deus, e isto, da maneira mais poderosa e terrível. A tudo isto, aos poderes, e ao estado por eles provocado, e a todas as conseqüências daí decorrentes, o Senhor Jesus foi, e é, a resposta de Deus. Mas havia um segredo a respeito dele, um segredo que somente inteligências espirituais podiam discernir, e o segredo era que Deus estava em Cristo. Ele era um Homem, porém, era muito mais do que isto; Ele era Deus. Nestas meditações, a nossa preocupação é com aquilo que o Senhor Jesus é como Filho do Homem, Homem Deus, Homem Celestial, em quem Deus estava, e está. Este segredo, este mistério oculto desde todas as eras, oculto dos homens, é o maior fator a ser levado em consideração.

No que diz respeito ao inimigo, seu principal objetivo em relação ao Senhor Jesus foi procurar se colocar entre Ele e aquele relacionamento Divino; a fim de colocar lá uma cunha, para, de alguma forma, deslocar o Senhor Jesus para um terreno separado daquele de íntima e profunda realidade do Pai. O significado das tentações no deserto é que elas foram uma tentativa de colocar lá aquela cunha, a fim de fazer o Senhor Jesus mover-se separado do Pai, mover-se em Seu próprio terreno humano. O inimigo sabia muito bem que, se tão somente ele conseguisse fazer o Jesus agir dessa maneira, ele iria conseguir do último Adão aquilo que havia conseguido do primeiro, e teria restabelecido o seu domínio e novamente obtido o senhorio. O segredo da vitória de Cristo foi que Ele estava tão unido ao Pai que em tudo Ele era governado pelo Pai, o qual habitava dentro dele. A vida do Homem Celestial, do Filho do Homem, cada vez mais nos faz prestar atenção à questão que uma vez saiu de Seus próprios lábios: “Não credes que eu estou no Pai e que o Pai está em Mim?” (João 14:10,11). Foi nesta base que Jesus viveu Sua vida e enfrentou o inimigo, e por ter Ele permanecido nesta base, o inimigo foi incapaz de destruí-lo.

Muitas tentativas foram feitas pelo Diabo, a fim de destruir o Senhor Jesus, tanto diretamente como por meio dos homens, mas era impossível enquanto Ele permanecesse no Pai, e Ele permaneceu assim até o fim, e triunfou devido a este relacionamento interior no qual Ele deliberada, consciente e persistentemente vivia: o Pai estava nele, e Ele e o Pai eram um; Ele habitava no Pai, e o Pai habitava nele.

Mas – e este é um dos pontos principais que desejo que o Senhor nos revele aqui – este foi o grande segredo, o maravilhoso segredo que os homens não podiam compreender; pois Ele mesmo disse, “...ninguém conhece o Filho, exceto o Pai...” (Lucas 10:22). João, escrevendo sua epístola muitos anos depois, disse: “...o mundo não nos conhece, porque não conheceu a Ele” (1 João 3:1). O mundo não O conheceu. Em Sua própria oração, registrada por João, temos as seguintes palavras: “Pai justo, embora o mundo não Te conheça, Eu Te conheço...” (João 17:25). A glorificação dele haveria de se dar na base deste relacionamento secreto. A glorificação do Senhor Jesus estava ligada a este segredo.

Agora queremos saber o que foi a glorificação do Filho, a glorificação do Homem Celestial. Novamente iremos primeiro tomar a questão em relação ao Homem Celestial, como pessoa, e, então, ver como a mesma coisa se aplica ao Homem Celestial Corporativo.

“Tendo ele, pois, saído, disse Jesus: Agora é glorificado o Filho do homem, e Deus é glorificado nele. Se Deus é glorificado nele, também Deus o glorificará em si mesmo, e logo o há de glorificar”. (João 13:31,32).

Não precisamos nos preocupar por ora com a forma da declaração. Ela soa um tanto comprometida e difícil, mas vamos tomar a declaração abrangente central: “Agora o Filho do Homem é glorificado, e Deus é glorificado nele....” É na palavra “agora” que tudo se apóia, e o Senhor Jesus coloca nesta pequena palavra um tremendo significado. A que esta palavra se refere? “Quando, pois, ele (Judas) saiu, Jesus disse: Agora o Filho do Homem é glorificado”.

O Rejeitado Homem Natural

Confesso que Judas foi um problema para mim por muitos anos, mas penso que estou me aproximando da verdade acerca dele, e esta passagem parece nos dar a pista. O problema, naturalmente, tem sua ocasião na declaração do Senhor Jesus de que Ele conhecia aqueles a quem Ele havia escolhido: “Respondeu-lhe Jesus: Não vos escolhi a vós os doze? Todavia um de vós é um diabo” (João 6:70). Ele escolheu Judas e o trouxe para se associar consigo mesmo, de tal maneira que ele teve as mesmas vantagens e facilidades que os demais; todos os benefícios dos demais estavam à disposição dele. Não há qualquer sinal de parcialidade. Jesus aparentemente colocou Judas exatamente na mesma posição, sem o excluir de coisa alguma daquilo que os demais tinham acesso, tudo de forma deliberada, consciente, sabendo aquilo que Ele estava fazendo, e sabendo, também, o tempo todo aquilo que Judas estava fazendo. Então, tudo leva a esta declaração: “Agora o Filho do Homem é glorificado...”

Eu não sei como colocar isto de forma melhor, e gostaria de ter linguagem e sabedoria para expressá-lo, de modo que capturasse o seu coração do mesmo modo que capturou o meu; pois estou regozijante interiormente com aquilo que é trazido a nós aqui. Para começar, isto representa o pleno desenvolvimento do homem sob a bondade de Deus: “...Porque faz que o seu sol se levante sobre maus e bons, e a chuva desça sobre justos e injustos” (Mateus 5:45). Deus não tem demonstrado qualquer parcialidade entre os homens. Ele torna possível a todos os homens desfrutar dos Seus benefícios. Ele tem mostrado grande bondade aos homens incrédulos, rebeldes, ímpios. Ele não discrimina ninguém. Todos os homens podem conhecer a Sua bondade. O homem está, assim, representado em Judas, que, nesta maneira figurativa, é aqui colocado em relação com o Senhor, de modo que aquilo que está disponível aos que são realmente do Senhor também está disponível a ele; ele pode entrar, está aberto a ele. O Senhor não demonstra qualquer parcialidade. O homem, vivendo sob a beneficente, misericordiosa e graciosa vontade, propósito, pensamento e desejo de Deus, pode evoluir a isto.

Vamos procurar explicar isto. O homem tem sido provado em todas as condições desde o princípio. Primeiramente ele provou o período da inocência. Como ele se comportou? Fracassou. Então, em seu estado caído, ele foi novamente provado, sem lei. Como ele se saiu? Fracassou de novo. Então foi provado estando debaixo da lei, mas fracassou, como antes. O homem tem fracassado sob todas as condições. Ele tem sido provado por Deus em cada estado e designação, e tem fracassado completamente. O fim sempre tem sido uma tragédia. Não importa que atitude Deus tome em relação ao homem, em si mesmo ele é um fracasso e irá obter a tragédia mais terrível.

Olhe para Israel. Qual é a atitude do Senhor em relação a ele? Quão maravilhosa é a maneira que o Senhor lidou com Israel. Olhe para a paciência de Deus com Israel, para a Sua bondade, a base sobre a qual Israel foi colocada diante dele. Em efeito, Deus disse: Você tem apenas que mostrar fidelidade a Mim para receber imediatamente a benção. Alguns de nós gostariam de poder obter a benção tão instantaneamente quanto Israel, quando Israel era fiel ao Senhor. Eles foram sujeitos a cuidados especiais, porém, fracassaram. A condição e tratamento que eles receberam está figurativamente colocada na figueira infrutífera, a qual não dava fruto, apesar de anos de cuidado. A justiça exigia que ela fosse cortada sem demora, porém, ainda outra oportunidade lhe é dada: “Permita que cavemos ao redor dela e coloquemos adubo ainda este ano”. Mostremos bondade durante mais este ano! No entanto, foi mais um grande fracasso. Assim é o homem; mesmo quando provado sob todas as condições, colocado em contato com a vontade beneficente de Deus, ainda assim é um fracasso.

Judas resume o homem, a quem está aberto tudo aquilo que Deus possui; o homem é colocado em contato com toda a boa e perfeita vontade de Deus, contudo, em si mesmo, é o mais terrível fracasso, pois este mesmo homem, quando atinge o seu máximo, ele trai o seu Senhor; o homem é tão sem esperança. O homem em si mesmo, embora as misericórdias de Deus possam ser dispensadas a ele, chega a isto. Este é o terrível final. “Até o meu próprio amigo íntimo, em quem eu tanto confiava, que comia do meu pão...”, diz o salmista, “levantou contra mim o seu calcanhar” (Salmo. 41:9). Assim irá fazer o homem no meio de tanta riqueza da graça de Deus.

Aqui está Judas, representando aquele que foi posto em contato com o Senhor, a quem todas as bençãos estão acessíveis, da mesma maneira que estão acessíveis a todo restante do próprio povo do Senhor, e é assim que ele reage. Este é o quadro do homem em si mesmo. Não é isto verdade? O pleno desenvolvimento do velho Adão, do primeiro Adão, em quem Deus não habita, é aqui mostrado a nós. Exatamente no ponto onde este homem está, cercado por todas as vantagens, por todas as facilidades, por todas as bençãos, por todas as oportunidades, por tudo aquilo que podia ter lhe pertencido, exatamente neste ponto, este homem vai e trai o seu Senhor: “...e era noite” (João 13:30). Há um universo de significado nisto.

A Eleição do Homem Celestial de Deus

Imediatamente após aquele homem ter ido embora, o Senhor Jesus e diz: “Agora o Filho do Homem é glorificado...” O que isto significa? Esta é a resposta de Deus a tudo aquilo. Deus possui outro Homem, cujo caminho será completamente diferente daquela tragédia, daquela calamidade escura, um Filho de Homem que pode ser glorificado. Deus preparou o Seu próprio Homem para assumir o lugar daquele outro, tão logo alcance ele o seu fim: e que terrível fim é! Você compreende o que é revelado com o fim de Judas? Quando ele sai, Deus traz o Seu Homem, o qual pode ser glorificado.

Você entende por que o Senhor Jesus escolheu Judas? Você entende por que é que, quando Judas sai, Jesus diz: “Agora o Filho do Homem é glorificado?” Lá estava um que representava o homem adâmico e aquilo à que ele chega, a despeito de toda a graça e misericórdia de Deus que está à sua disposição. Até que haja algo nele diferente dele mesmo, é isto o que ele alcança. E apenas quando esta natureza, este homem, esta raça vem à tona em sua plena terribilidade, em seu desenrolar pleno, erguendo o seu calcanhar em traição contra o Deus de toda graça; é apenas quando este homem atinge o seu máximo e vai para as trevas, para a noite eterna, que Deus começa o Seu novo dia, trazendo o Seu novo Homem para assumir o seu lugar.

Qual é o segredo? Que tipo de homem irá ser glorificado? Vimos o homem que não pode ser glorificado, que vai para as trevas. Que tipo de homem, então, é este que pode ser glorificado? Qual é o princípio e o segredo de Sua glorificação? É aquele que Deus está nele. Qual é a glorificação do Senhor Jesus? É o irrompimento e a manifestação do Pai nele, daquele segredo que O torna diferente daquele tipo representado por Judas. A esperança da glória no caso de Jesus, a certeza da glória, era o Pai habitando nele. “Agora é o Filho do Homem glorificado, e Deus é glorificado nele...” Esta é uma declaração ampla a respeito da glorificação do Filho do Homem. É extraordinário que esta declaração possa ser encontrada no evangelho de João, no qual o Senhor Jesus é preeminentemente colocado como o Filho de Deus.

A Glorificação do Homem Celestial Corporativo

Agora, naturalmente, chegamos a sentir o benefício e o poder disto, quando a glorificação é transferida do Homem Celestial pessoal para o Homem Celestial Corporativo. Assim, o apóstolo diz: “para que Cristo possa habitar em seus corações através da fé...” (Efé. 3:17); “...Cristo em vós, a esperança da glória...” (Col. 1:27). Lemos no início da carta aos efésios que somos “...habitação de Deus no Espírito” (2:22). O que isto significa em seu valor e resultado? Este corpo, criado e vivendo a realidade deste fato, é tão indestrutível quanto o próprio Cristo, está tão certo da vitória quanto Cristo estava. Baseado no princípio de que Cristo habita no seu coração pela fé, este Corpo pode entrar em luta contra os principados e potestades, contra os dominadores das trevas, das hostes espirituais da maldade nos lugares celestiais, e sair vitorioso neste terreno.

Qual é o segredo da glorificação da igreja, o Corpo de Cristo, o Homem Corporativo, e qual é a natureza desta glorificação? É a mesma coisa. É a manifestação do segredo, a revelação daquilo que é verdadeiro, do Cristo que está lá dentro. Durante o curso desta dispensação, o segredo está na igreja, nos membros de Cristo, mas “...o mundo não nos conheceu, porque não conheceu a Ele” (1 João 3:1). Olhados a partir do nosso exterior, somos muito pouco diferentes das demais pessoas do mundo. Contudo, o segredo está lá, e este segredo significa que, se você tocar determinada pessoa, ou determinada igreja, você toca no próprio Deus. “Saulo, Saulo, por que Me persegues?” disse o Senhor, quando ele estava perseguindo os membros do Corpo de Cristo. Cristo está em Seus membros. Você terá que se haver com Ele. Os membros são indestrutíveis; não podem ser destruídos. Não estamos falando da destruição do corpo. A igreja é uma entidade indestrutível. Quando Satanás fizer o seu pior, a igreja ainda irá permanecer triunfante, irá permanecer para sempre; quando Satanás e tudo o que lhe pertence tiver sido banido do universo.

Ao final desta dispensação, a qual tem retido este segredo, haverá uma revelação do Cristo em Sua igreja, quando ela se manifestar com Ele em glória, e ela será glorificada baseada naquele mesmo princípio que Cristo foi glorificado.

A Base Essencial da Base da Vida Diária do Cristão

Agora, há algo que devemos tomar em nossos próprios corações desses fatores inclusivos. Temos que viver o tempo todo nesta base na qual fomos estabelecidos, e, ao assim fazermos, o poder do inimigo é completamente anulado. Nosso problema é que não vivemos nesta base. Vivemos muito baseados em nós mesmos. Vivemos baseados em nossos próprios sentimentos, em nossas próprias condições, em nosso próprio estado, em tudo o que é de nós mesmos, e por agirmos assim, simplesmente nos transformamos em joguetes nas mãos do Diabo. Quando nos baseamos em nosso próprio estado de humor, que confusão o inimigo faz de nós. Quando nos baseamos em nossos próprios sentimentos, em nossos próprios pensamentos, quanta destruição há. Tudo o que é de nós mesmos, se nos basearmos e vivermos nele, dará ao inimigo uma oportunidade para ele fazer o que quer. Sempre que os cristãos se voltam para si mesmos, para o terreno daquilo que eles são, mesmo que seja por um instante, eles começam a perder o seu equilíbrio, a sua paz, a sua serenidade, o seu descanso, a sua paz, a sua alegria, e são lançados ao redor, segundo a vontade do Diabo. Eles podem até mesmo chegar à situação onde se perguntem a si próprios se de fato são pessoas salvas. Lembremos de que a parte de nós que ainda pertence à criação caída, e que não irá sobreviver, que esta parte serve de terreno para o inimigo, e não adianta tentarmos fazê-la sobreviver.

Temos, por exemplo, um corpo físico. Dentro do compasso desta vida natural, física, como parte da velha criação, tudo é possível. Escuridão mental é possível. O distúrbio do nosso sistema nervosa pode ser de tal ordem que nos faça sentir que o inferno se enfurece em nosso próprio ser. Tudo é possível em relação ao humor, aos sentimentos, às sensações, ao estado de morte e completo entorpecimento, e, se vivermos em tal terreno, o Diabo será devastador. Ele imediatamente se instala sobre tais coisas se assumirmos a nossa condição natural como critério. Não há esperança de glória no terreno natural.

Como poderá ser o inimigo derrotado, anulado, roubado do seu poder? Baseado no princípio que se deu na vida do Senhor Jesus, através do nosso viver no Pai. Devemos permanecer na habitação de Cristo. Nossa atitude terá que se voltar continuamente na direção do Senhor: Senhor, em mim Tu és uma Pessoa diferente daquilo que eu sou; Tu não és o que eu sou; Tu és diferente do meu humor, do meu sentimento, ou da minha ausência de sentimento; Tu és diferente de todos os meus pensamentos, diferente de mim! Eu estou morto no que diz respeito aos meus sentimentos, mas Tu és diferente de tudo isso; Tu estás vivo! Eu me sinto no escuro, Tu és a luz, e Tu estás em mim! Isto aqui sou eu, e não o Senhor! Se tão somente você e eu aprendermos continuamente (isto demandará tempo; será algo progressivo) a viver em Cristo, naquilo que Ele é, no fato de que Ele é diferente do que somos – não sobre nossa experiência nisso, porém baseados no fato de que Ele vive em nós – se continuamente aprendermos a viver desta maneira, por esta grande realidade Divina, então o inimigo não terá nada em nós. O Senhor Jesus era capaz de dizer, “...o príncipe deste mundo se aproxima; e ele nada tem em Mim...” (João 14:30). À procura de que estava o adversário? Ele estava procurando encontrar o Senhor Jesus vivendo em Si mesmo, consultando os Seus próprios sentimentos, apoiando-se em Seu próprio conhecimento, seguindo os Seus próprios julgamentos, a Sua própria vontade. Se o Diabo pudesse apanhar Jesus vivendo desta maneira, ele teria conseguido algo nele e teria desequilibrado a balança de Sua vida. O Senhor Jesus foi capaz de dizer: “...Eu vivo por causa do Pai...” (João 6:57); Eu vivo pelo Pai, não por aquilo que sou. Jesus podia dizer que, embora fosse perfeito e sem pecado, contudo vivia na dependência do Pai o tempo todo. A partir disso nós temos o Seu próprio testemunho: “O filho nada pode fazer de Si mesmo...” (João 5:19); “...as palavras que eu vos digo, não as digo de Mim mesmo; mas o Pai que está em Mim é que faz as Suas obras” (João 14:10). Ele vivia o tempo todo no Pai, O qual vivia nele, e, por causa disto, o inimigo não tinha qualquer brecha.

Esta é a lição de vida para nós. Para qualquer glória interior agora, ou para qualquer esperança de glória no grande dia da manifestação, a única base de expectação deve ser Cristo em nós; porque a glória simplesmente é a manifestação do Cristo que está dentro de nós, assim como a glorificação dele foi a manifestação do Pai que estava nele.

A Igreja, o Mistério da Habitação Divina

Agora, em relação à expressão corporativa deste Homem Celestial, na carta aos efésios o apóstolo nos fala que algo está em andamento no mundo espiritual, a propósito do qual é afirmado o seguinte: “...Para que a multiforme sabedoria de Deus seja agora dada a conhecer por meio da igreja aos principados e potestades nos lugares celestiais...” Eu me pergunto o que isto significa? Eu não sei totalmente, mas penso que consigo ver algo do seu significado. Creio que as inteligências espirituais estão assistindo, a fim de ver como podem elas levar alguma vantagem. Elas estão assistindo com toda perspicácia, inteligência, sabedoria e engenhosidade diabólica, com toda inteligência sobre-humana, para ver como podem elas levar vantagem, como podem dar um golpe, se de alguma maneira puderem levar vantagem nesta criação misteriosa, a igreja. Para os principados e potestades a multiforme sabedoria de Deus está sendo conhecida por meio da igreja. Como está sendo isto alcançado? Uma frase a partir de um versículo na primeira carta a Timóteo irá, penso, ajudar-nos em relação à resposta. “grande é o mistério da piedade; aquele que foi manifesto na carne, justificado no espírito, visto dos anjos, pregado entre as nações, crido no mundo, recebido no alto em glória.” Uma parte do mistério falado aqui é esta declaração um tanta quanto obscura de que Ele “foi visto dos anjos”. Não posso ficar satisfeito com o pensamento de que isto apenas significa que os anjos celestiais viram Jesus, tanto quando Ele este na carne, quanto após a Sua ressurreição. Isto parece dizer ao meu coração (naturalmente eu não posso prová-lo, mas estou comparando com a escritura, e levando em conta que é o Espírito quem tem descortinado este fato e trazido isso ao nosso conhecimento) que tais anjos, tais inteligências espirituais, as quais estiveram assistido, procurando uma oportunidade contra a vida de Jesus, buscando levar uma vantagem, usando de perspicácia, entenderam, finalmente, quem Ele era; enxergaram o pleno significado de Sua pessoa, e o porquê de eles jamais terem sido bem sucedidos em alcançar seus intentos, tendo sido compelidos a reconhecer a sua impotência em relação a Jesus. Essas inteligências espirituais sabem isto agora porque o segredo lhes foi revelado. Este Homem é diferente do primeiro Adão! Essas inteligências tiveram sua chance com o primeiro Adão e aproveitaram-na, e naquela raça trouxeram sua sabedoria diabólica da qual o apóstolo diz: “Esta sabedoria é ... diabólica [demoníaca]” (Tiago 3:15).

Essas inteligências se mantiveram esperando por uma oportunidade, a fim de trazer sua sabedoria para este outro Adão, para este último Adão, mas não conseguiram. Foram esmagadas e derrotadas em cada ponto, e, agora, o segredo está revelado, e elas conseguem enxergar quem era Aquele sobre quem elas não podiam levar vantagem. Por que foi assim? Porque o Pai estava em Cristo. É a esta mesma verdade que Paulo se refere quando diz que Cristo crucificado, tão distante de ser a sabedoria deste mundo, é a sabedoria de Deus. Sua sabedoria transcende em muito a sabedoria deste mundo, a qual, em sua natureza, é demoníaca. Deus ainda está mostrando a Sua multiforme sabedoria aos principados e potestades através da igreja, que é o Corpo de Cristo, o Homem Celestial Corporativo. Como isto está sendo alcançado? Através deste mistério interior, derrotando cada plano e cada esquema deles, por meio da grande realidade da habitação do Senhor, cuja sabedoria é muito maior do que a deles.

Oh, que possamos viver baseados nesta grande e essencial realidade, neste grande segredo do próprio ser da igreja conforme a mente de Deus, neste segredo básico de Cristo em nós; não baseados no que somos, mas no que Cristo é. Se você assumir esta posição, você ficará numa posição de sabedoria que supera toda a astúcia do Diabo, e vence todo o seu poder.

Coloque isto à prova; isto está aberto à prova prática a qualquer tempo. Se, quando você estiver prestes a se sentir desesperadamente mal, sem esperança, cheio de mal em você mesmo, como que se tudo o que você tivesse crido não servisse para mais nada, e tudo tivesse se esfacelado, e você até mesmo chega a crer que tudo está perdido; se, quando isto ocorrer, você assumir a posição de que tudo isso é devido à sua pobre e arruinada criação, mas que Cristo em você é algo diferente de tudo isso, e pela fé você se apoiar nele, o poder do Diabo é destruído, a sabedoria dele é vencida, e, então, haverá glória. Esta é a lição que temos que aprender. Cristo em você, e na igreja como a habitação de Deus por meio do Espírito, é o símbolo da glória, da vitória, do poder e da sabedoria. Bendito seja Deus, há momentos quando isto alcança os nossos sentimentos e nos alegramos com a percepção de que Cristo está em nós, porém, não é sempre assim. Um ataque de indigestão pode ter um efeito estranho em nossa vida espiritual, no que se refere à nossa consciência. A coisa mais insignificante pode vir e mudar a situação toda se nos permitirmos entrar nas coisas. Quantas coisas o inimigo coloca, a fim de nos envolver com elas! Ele se ocupa colocando armadilhas em toda a parte, tramando situações ao nosso redor, sempre pronto a nos assustar com alguma coisa. Como tudo é muito bem arranjado, justamente na hora em que menos queremos ser perturbados. Saia daqui e vá para sua casa, após um período com o Senhor no meio do Seu povo, sentindo-se gloriosamente enlevado, e, provavelmente, quando você estiver atravessando os degrais da porta, haverá algo esperando por você!

Como irá você vencer o Diabo; vencê-lo estrategicamente, derrotá-lo? Não será se envolvendo nas coisas. Não é fácil, mas não se envolva nelas; não seja arrastado para o campo da velha criação, a ponto de ficar envolvido nele, mas permaneça no terreno em que o adversário é obrigado a enfrentar a perfeição de Cristo, esta é a maneira segura de derrotarmos o inimigo, embora tenhamos que suportar a situação difícil, suportar a dor, sofrê-la por um período de tempo considerável. Mas a nossa posição é a de que Cristo é mais do que isto, Cristo em nós é mais forte que isto, e devemos recorrer à fé interior, devemos buscar ajuda em Cristo que está dentro de nós, rejeitando a situação. Davi vem em nossa ajuda exatamente neste campo. Você irá se lembrar de que em certa ocasião ele falava toda sorte de palavras deprimentes; coisas sem esperança, porque a situação parecia completamente impossível; e, então, ele recordou a si mesmo, e disse: “Esta é a minha enfermidade; mas eu irei me lembrar dos anos da destra do Altíssimo” (Salmos 77:10). Hoje eu vejo as coisas de forma distorcida! Esta é a minha maneira de enxergá-las! Esta é a maneira como as coisas me afetam! Isto sou eu; não é o Senhor! Coloquemos as coisas nos seus devidos lugares, e demos a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus.

Estou certo de que aqui está a chave de tudo; a chave de tudo é Cristo em você, Cristo em mim, Cristo em Seu Corpo, e isto vivido pela fé. Esta é a chave para a sabedoria superior, para superar e vencer o inimigo. Ele será derrotado se vivermos em Cristo e nos recusarmos a viver em nosso próprio terreno. O Senhor deixa isto claro a nós.

Em consonância com o desejo de T. Austin-Sparks de que aquilo que foi recebido de graça seja dado de graça, seus escritos não possuem copirraite. Portanto, você está livre para usá-los como desejar. Contudo, nós solicitamos que, se você desejar compartilhar escritos deste site com outros, por favor ofereça-os livremente - livres de mudanças, livres de custos e livres de direitos autorais.