por T. Austin-Sparks
Capítulo 7 – O Homem como Instrumento do Propósito Eterno
O Homem celestial pessoal é apresentado a nós pelo apóstolo João de uma forma mais completa que qualquer outro escritor do Novo Testamento. Paulo avança na direção do Homem celestial corporativo. Isto não significa que Paulo não apresenta o Homem celestial pessoal, pois ele, sem dúvida, faz isto, particularmente em sua carta aos colossenses; mas Paulo avança do Homem celestial pessoal para o Homem celestial corporativo, que é a igreja, o Corpo de Cristo.
Podemos repetir uma coisa. Cristo, verdadeira e literalmente estava com o Pai antes dos tempos eternos, e a igreja, não efetiva e literalmente, mas em presciência e em preordenação, também estava lá com o Pai e com o Filho. A revelação plena da igreja, que chegou até nós por intermédio do apóstolo Paulo, mostra que ela já estava completa, embora saibamos que de forma alguma ela estava completa na ocasião em que Paulo escreveu. Ela não estava completa nem numérica, nem moral e nem espiritualmente, embora Paulo fale dela como se fosse a coisa mais completa e perfeita do universo. É que ele estava, por assim dizer, posicionado no mesmo lado de Deus, e Deus vê a igreja a partir do ponto de vista eterno, isto é, como estando do lado de fora do tempo.
Reconhecendo, então, que Cristo e a igreja sejam mostrados como estando com o Pai desde a eternidade, a seguir vemos que, em virtude daquilo que aconteceu na queda, e que foi antecipado na linha redentora do propósito, Cristo entra no tempo, nascendo nele em relação à redenção, a redenção “deste presente século mal”. A Versão Autorizada traduz como “mundo”, mas a mudança é importante. Não é de um lugar que somos redimidos, mas de uma era, e está muito claro o que tal era significa. Ela abrange todas as seções ou dispensações. O presente século mau vai de Adão até os novos céus e a nova terra. Há uma gloriosa era vindoura. Ser redimido deste presente século mau significa que a igreja, que pertence à eternidade e não a esta era, precisa ser resgatada do presente século mau. Isto mostra como Cristo, pela redenção, traz a igreja de volta à linha reta do que é eterno e que está fora do tempo, para os eternos conselhos e propósitos de Deus concernentes ao Seu Filho. Pela redenção que está em Cristo, a qual é uma redenção do presente século mau, a igreja é resgatada para outra era, para uma era eterna. Assim, o nascimento de Cristo está relacionado à redenção da propriedade de Deus, da redenção da igreja.
Chegando a João, primeiramente no que diz respeito à entrada de Cristo no tempo, descobrimos que João tem três coisas a nos dizer a respeito de Cristo.
“No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus” (João 1:1). Isto é Cristo antes do tempo.
“E o Verbo se fez carne e tabernaculou-se entre nós...” (João 1:14).
Esta terceira coisa, que é afirmada no evangelho de João, é declarada pelo próprio Senhor, e combina com as duas primeiras. O Filho, que está aqui em carne, também está ao mesmo tempo no céu. Há a união das duas esferas. Embora Ele esteja aqui, ainda continua no céu; embora esteja no tempo, ainda permanece na eternidade. “Ninguém subiu ao céu, senão aquele que desceu do céu, o Filho do Homem, que está no céu” (João 3:13). Este é o Homem Celestial como nos é apresentado por João; Cristo na terra, e, ao mesmo tempo, no céu.
Agora, em Cristo, isto se torna verdade na igreja, e em cada membro dela. Em Cristo nós estamos aqui, e, ao mesmo tempo, estamos no céu. Estamos no tempo, mas também estamos na eternidade. Surge a pergunta: Como pode ser isto? É uma declaração que precisa ser explicada.
Isto nos traz ao ponto onde a relação eterna e celestial é retomada. Esta relação foi quebrada, interrompida. Em Cristo, como Homem representativo, a relação é reatada. Com Ele esta relação jamais foi interrompida. A interrupção tem a ver com o homem, mas, através da união com Cristo, esta relação — numa forma mais plena — é recuperada, ou restaurada ao homem. Qual é o ponto onde esta retomada acontece? Ele é conhecido entre nós como sendo o novo nascimento, ou, nascer do alto. Sua lei e sua mola principal é a vida eterna.
Duas coisas estavam evidentemente relacionadas na mente judaica. Eram elas: (1) o reino do céu, e (2) a vida eterna. Nicodemos perguntou o que ele devia fazer para entrar no reino do céu. Outra autoridade, provavelmente da mesma escola que Nicodemos, e, talvez, do mesmo nível que ele, fez a seguinte pergunta: “Mestre, que devo fazer para herdar a vida eterna?” (Lucas 10:25). Estas coisas eram claramente aceitas pelos judeus como uma promessa. O Senhor Jesus reconheceu e se referiu a esta expectativa quando disse: “Examinais as escrituras porque pensais ter nelas a vida eterna...” (João 5:39). Havia uma busca pela vida eterna, uma expectativa, uma esperança, uma persuasão de que a vida eterna era uma promessa a ser realizada. Estas duas coisas estavam juntas na mente deles. Cristo associa esta esperança a Si mesmo e diz, a respeito do testemunho das escrituras: “...são elas que de Mim testificam”. Aos que podem receber isto, Ele indica a Si próprio como sendo o caminho ou a escada que leva ao céu; necessariamente Ele é o meio de se chegar lá. Estamos, obviamente, fazendo referência a João um, versículo cinqüenta e um. Agora leia o versículo quarenta e sete:
“Jesus viu Natanael que vinha a Ele, e lhe disse: eis aí um verdadeiro israelita, em quem não há dolo!”
Aqui está um verdadeiro israelita. O que você pode dizer a um verdadeiro israelita que está esperando o reino do ceú, a vida eterna, um homem verdadeiro e honesto? O Senhor o viu debaixo da figueira, em busca do reino do céu e da vida eterna, isto se realmente aquilo que o Senhor falou a ele de fato foi uma pista para aquilo que estava se passando no coração dele. Ele era um daqueles que aguardavam as bençãos de Israel.
Vamos pausar por um instante, a fim de inserir aqui o salmo 133, em colchetes. “Oh! quão bom e quão suave é que os irmãos vivam em união.
... porque ali o Senhor ordena a bênção e vida para sempre.” Como é que a benção vem? De onde vem esta esperança, esta expectação de benção? Nossa pergunta nos leva à promessa feita a Abraão: “...em ti serão benditas todas as famílias da terra” (Gen. 12:3). Estes israelitas estavam esperando pelas bênçãos de Abraão. Mas vejam o que foi dito mais tarde: “...em Isaque será chamada a tua semente” (Gen. 21:12). O que Isaque representava? Vida a partir da morte, vida Divina. A benção de Abraão é vida. Agora observe as palavras do salmo: “...ali o Senhor ordena a benção e a vida para sempre”. Assim, você vê que aquilo que eles buscavam era a benção, a qual tinha dois aspectos, o reino do céu e a vida eterna.
Em Natanael vemos um verdadeiro israelita, em quem não há dolo, um homem puro numa busca justa. O Senhor diz a um homem como este: “você verá o céu aberto, e os anjos de Deus subindo e descendo sobre o Filho do Homem”. Está você à procura do reino do céu? “você verá o céu aberto…” Você quer alcançar o reino? Você irá precisar de uma escada, de um caminho, de um meio, de um veículo: “Você verá os anjos de Deus subindo e descendo sobre o Filho do Homem”.
Natanael sabia exatamente a que o Senhor estava se referindo. Um verdadeiro israelita, em quem não havia nenhum tipo de ‘Jacó’ nele, era Natanael! Lembremo-nos do incidente a que o Senhor se referiu. “E Jacó … chegou a certo lugar... pegou uma pedra e a colocou sob sua cabeça, e deitou ali para dormir. E ele teve um sonho: eis que uma escada foi colocada sobre a terra, cujo topo alcançada o céu; e os anjos de Deus desciam e subiam por ela. E eis que o Senhor estava em cima dela, e disse:... Eu sou contigo, e te guardarei por onde quer que fores... E Jacó despertou do seu sono, e disse... Que terrível é este lugar! Este lugar não é outro senão a casa de Deus, e esta é a porta do céu” (Gen. 28:10–17) — Betel, a Casa de Deus: o portão do céu. O Senhor Jesus apropria-se disto e diz, em efeito: ‘Eu sou a Casa de Deus, a porta do céu. Você irá ver o céu aberto através de Mim’. Você quer saber como chegar ao céu? Duas coisas precisam ser consideradas; uma é o fato da união com Cristo, outra é que aquilo que está ligada a esta união com Cristo – ou seja, a vida eterna.
Vamos ficar com isto por um momento. “Vereis o céu aberto…” Tal declaração implica que os céus estavam fechados. Isto, novamente, carrega consigo o fato de que, para o homem, a vida eterna também tinha sido colocada por detrás de um céu fechado. Mesmo para Natanael, para Nicodemos, e para qualquer verdadeiro israelita isto é verdade por natureza. O anseio deles é por um céu aberto. Eles esperavam pelo reino do céu, mas ele estava fechado.
Sabemos muito bem que o céu é um reino fechado para qualquer pessoa, por natureza. Mas, um reino fechado não é o desejo de Deus para nós. Nós pertencemos ao céu. Cristo pertence ao céu. A igreja pertence ao céu. Contudo, o mesmo lugar ao qual pertencemos está fechado para nós. O lugar com o qual estamos relacionados nos eternos conselhos e propósitos de Deus é um lugar fechado para nós, por natureza. Isto teve a sua manifestação mais terrível naqueles momentos da cruz, quando o Senhor Jesus, ocupando o lugar do homem em seu pecado, gritou: “Deus meu, Deus meu, por que me desamparastes?” O Céu está fechado para mim; o lugar ao qual eu pertenço, o meu céu, a minha casa, está fechada para mim! Sou um banido do céu!
Este é o estado do homem, por natureza, separado do céu, do lugar para o qual ele foi criado, do lugar que pertence a ele no propósito de Deus. O Senhor diz a Natanael: “Verás o céu aberto”. Há muito mais significado na frase tantas vezes usada por nós, “um céu aberto”, do que temos reconhecido. O que é desfrutar de um céu aberto? É estar em casa, em comunhão com o Senhor; é ter uma vida celestial; é ter todos os recursos celestiais à nossa disposição; tudo o que o céu significa está aberto para nós, e nós alcançamos aquilo para o qual Deus nos trouxe à existência, o qual Ele desejou que fosse nosso desde a eternidade; isto é um céu aberto. “Vereis o céu aberto....” Então a busca do coração é satisfeita, a promessa é realizada. O princípio do céu aberto, ou da vida celestial, é o que é chamado de vida eterna em Cristo. Cristo é o Homem celestial, que entrou no tempo.
Dissemos uma ou duas vezes que a igreja deve ser aquilo que o Homem Celestial era, e é, quanto ao seu Ser, quanto às leis da Sua vida, quanto ao Seu ministério. Tudo o que é verdade sobre Ele, na condição de Homem Celestial, tem que ser verdade na igreja. Assim, da mesma forma que o Senhor Jesus, como o Homem Celestial, nasceu aqui no tempo, também a igreja, o Homem Celestial Corporativo, teve um nascimento aqui no tempo, e no mesmo princípio que Cristo nasceu.
De que forma Cristo nasceu? Você irá perceber que estamos deixando a questão da Deidade de lado. Não estamos tocando neste aspecto, absolutamente. No sentido em que Cristo é Deus encarnado, Emanuel, Deus conosco, Deus manifestado na carne, isto não é verdade em relação a nós, como membros da igreja. Isto está entendido. Estamos falando sobre o Homem Celestial, não do Filho de Deus, não de Deus. Assim, aquilo que é verdade sobre Jesus, como Homem Celestial, no que diz respeito ao Seu nascimento, também tem que ser verdade sobre toda a igreja, em cada parte. Vamos olhar para o nascimento do Senhor Jesus e marcar como está ele caracterizado por três coisas.
Voltemos a Lucas, pois Lucas amplia o que João diz. João resume tudo numa afirmação: “E o Verbo se fez carne e habitou entre nós...” É Lucas quem nos fornece a descrição mais completa sobre o Verbo tornando-se carne, o nascimento de Cristo. Não iremos ler a história toda, mas observemos, primeiramente, como o anjo foi a Maria e apresentou a ela uma palavra. Ele fez o pronunciamento e, então, esperou. Em sua perplexidade, Maria fez uma pergunta. O anjo aceitou a pergunta dela, e novamente esperou. Então veio a resposta: “eis aqui a serva do Senhor; cumpra-se em mim segundo a tua palavra”. (Lucas 1:38). Antes de tudo, a palavra é apresentada: este é o primeiro passo em Seu nascimento, a palavra é apresentada, a declaração é feita. Então, o anjo esperou. O que você irá fazer com esta palavra? Como você irá reagir a ela? A palavra apresenta um desafio; sempre um desafio custoso. Esta palavra irá levá-la para fora do mundo; é para libertá-la dele. Maria pesa o custo enquanto o anjo espera. A batalha é travada, a tempestade se enfurece por um instante, e, então, está acabado, e, em total consciência, ela responde: “...cumpra-se em mim segundo a tua palavra”.
Você entende o que significa ser gerado pela palavra de Deus? O primeiro passo neste novo nascimento, nesta vida celestial, é a nossa atitude em relação à palavra de Deus que nos é apresentada, e isto irá governar cada passo nosso nesta vida celestial. Esta é a natureza do primeiro passo, e, igualmente, de cada passo subseqüente. Durante todo o caminho, o Senhor irá nos apresentar a Sua palavra, e, com ela, um desafio, um custo, um preço a ser pago, e irá haver um conflito sobre isto: Estamos nós preparados para andar por este caminho? Estamos nós preparados para aceitar a palavra? Estamos nós preparados para aquilo que a palavra significa, para aquilo que ela envolve? Da resposta ao que nos é apresentado depende o nosso conhecimento da vida celestial. Do início ao fim é assim.
É por isso que o Senhor nunca explicava tudo de imediato a pessoas não salvas. A doutrina era dada posteriormente aos crentes; jamais era dada a incrédulos. A eles eram feitas apenas declarações claras e concisas. Aos incrédulos era dada apenas uma apresentação de fatos, de forma ousada e deliberada. ‘Esta é a vontade de Deus’. Esta é a palavra de Deus. É isto o que você deve fazer. A explicação virá mais tarde. Agora, o céu irá permanecer fechado ou aberto; a questão da sua entrada na vida celestial está na balança, vai depender da resposta que você decidir dar à palavra de Deus. Você irá nascer da palavra, se responder a ela; irá ser gerado pela palavra da verdade’. Assim, a primeira coisa é a palavra oferecida, e, então, após algum conflito e dificuldade, aceitar, receber e se render a ela: “...cumpra-se conforme a tua palavra.”
Qual é o próximo passo? O Espírito faz a palavra germinar. O Espírito gera no interior por meio da palavra. Esta é a segunda coisa a ser observada no caso de Maria, o Espírito gerando, implantando. Enquanto não encontrar uma resposta, a palavra não pode se tornar algo vivo dentro de nós. É por isto que uma pessoa não salva jamais poderá conhecer o significado da Palavra de Deus. O significado de qualquer palavra de Deus demanda o trabalho interior do Espírito Santo, a fim de torná-la viva, a fim de fazê-la germinar, e a resposta à palavra abre caminho para o Espírito.
(3) A Palavra (Cristo) Formada no Interior Inicialmente e Progressivamente
Este é o terceiro passo. É muito simples quando apresentado desta forma, porém, este é o caminho para o céu, para a vida eterna. Observe você, isto é algo separado de Maria, de sua raça e de sua natureza. Pelo Espírito Santo houve uma completa distinção entre tudo aquilo que Maria era por natureza e aquele Ente Santo gerado nela. Além do que, é algo muito importante reconhecermos que é exatamente desta maneira que nascemos de novo. Quando Cristo nasceu de Maria, ou quando Cristo foi (podemos nós usar esta palavra?) gerado em Maria, aconteceu nela algo que estava completamente acima da natureza dela. Maria tinha uma linhagem bastante longa, e nesta linhagem havia toda sorte de pessoas, incluindo diversas prostitutas. Mas, quando o Espírito entrou e formou Cristo nela, Ele cortou e colocou tudo aquilo de lado. Aquele sangue não entrou em Cristo. Lembre-se disto! Ele não herdou nada daquilo, não importa o que fosse, fosse alto ou baixo, bom ou mau. O Espírito Santo cortou fora; Cristo era algo diferente de tudo aquilo, distinto: “...o Ente Santo....” Você jamais poderá dizer que Ele herdou o sangue de Raabe, ou de Rute, a moabita. É algo distinto.
Cristo em nós é algo diferente de nós mesmos. É isto que nos torna celestiais. Carne e sangue não podem herdar o reino do céu. Este é o nosso fluxo natural, nossa história natural, todo o curso da nossa relação adâmica, que não pode herdar o reino do céu. É somente aquilo que é de Cristo que irá herdar o reino do céu. É Cristo em nós que é a esperança da glória, e a única esperança da glória. Isto é algo diferente de Maria, de sua raça e natureza, algo diferente de nós mesmos. Isto que é gerado por Deus é do Espírito Santo. Você e eu precisamos sempre distinguir entre aquilo que é de Cristo e o que é de nós mesmos, e não misturar as duas coisas. Nada que não for de Cristo terá aceitação. Tudo tem que ser medido segundo Cristo, tem que passar pela peneira de Cristo, e a peneira é bastante fina; tudo precisa passar pela prova da morte, e a morte é um teste tremendo. Existe alguma coisa que a morte pode reter? Se há, ela irá fazê-lo. Tudo o que está sujeito à morte irá sucumbir a ela, e esta velha criação não é nada mais do que isto. Cristo não está sujeito à morte; Ele não pode ser detido por ela, pois não há nada nele que a morte possa reter. Esta é a nossa esperança da glória, Cristo em nós. Este Espírito Santo fazendo separação entre Maria e Cristo, entre nós e Cristo, e esta divisão fundamental feita pelo Espírito deve ser mantida constantemente em mente, pois somente quando fazemos isto é que Deus pode alcançar o seu propósito. Observe você, Deus pode alcançar o seu propósito muito mais rapidamente onde esta distinção é mantida, do que onde ela é desprezada. Esta é a importância de crentes sendo instruídos pelo Senhor a respeito daquilo que é essencial ao Seu propósito.
Cristo era diferente do resto dos homens a este respeito. Mesmo na infância Ele tinha outra consciência, como tivemos oportunidade de observar quando Ele tinha doze anos. Não o encontrando em seu grupo, seus pais terrenos o procuraram, e o acharam no templo, e lhe chamaram atenção: “Filho, por que agistes assim para conosco? Eis que o teu pai e eu ansiosos te procurávamos”. Ao que Ele respondeu: “...não sabíeis que eu deveria estar na casa do meu Pai?” (Lucas 2:48,49). É uma reprovação, mas, ao mesmo tempo, uma revelação de outra consciência. “Teu pai e eu...” — “...Casa do meu Pai...” Não é a casa de José. Aqui há o estabelecimento de um Pai no lugar de outro, de alguém que está acima do outro. É uma consciência celestial, uma consciência eterna, um sinal de que Ele é “outro”, gerado pelo Espírito Santo.
Quando, gerados pelo Espírito Santo, voltamos imediatamente à nossa eterna relação com Deus no Filho, uma nova consciência brota dentro de nós, uma consciência que não existia antes. Este “novo homem” que foi vestido possui uma nova consciência quanto aos relacionamentos celestiais.
Tudo o que está compreendido nas palavras “vida eterna”. Sabemos que a vida eterna não implica meramente o fato de duração; significa um tipo de vida. Esta vida eterna, vida do alto, vida Divina em Cristo, carrega consigo tudo aquilo que se refere ao Homem Celestial.
Considere novamente a pessoa do Homem Celestial. “Nele estava a vida…”; “Assim como o Pai possui vida em Si mesmo, também concedeu ao Filho ter vida em Si mesmo...” (João 5:26). No Evangelho de João, o Senhor Jesus fala muito a respeito de Si mesmo como sendo o Homem Celestial, como possuindo vida celestial, e esta vida celestial era a sede da natureza e da consciência celestial; foi através desta vida celestial que Ele se conduziu da maneira como se conduziu. Ele estava vivo para Deus através daquela vida que possuía, e isto é visto em ser Ele capaz de conhecer a Deus, os movimentos de Deus, as direções de Deus, os gestos de Deus, as restrições de Deus. Tudo isto estava reunido naquela vida. Este é o princípio de sua vida a partir do seu nascimento. É o princípio do nosso nascimento, e, igualmente, é o princípio de nossas vidas como o Homem celestial corporativo.
Esta vida se dá por meio do Espírito Santo. Ela está sempre relacionada a uma Pessoa; não é um mero elemento abstrato. Ela é inseparável da Pessoa, que é o Espírito Santo; e o Espírito Santo é o Espírito de Cristo. Quando você chega ao livro de atos, você tem muita coisa revelada sobre o dom do Espírito Santo. Se você olhar para isto mais de perto, verá que a chegada do Espírito Santo estava invariavelmente relacionada à união espiritual com Cristo. O pentecoste marcou o fim de um relacionamento físico com o Senhor Jesus; marcou o fim daquele extraordinário período de Suas aparições pós-ressurreição. É o início de um relacionamento interior e espiritual com Cristo. Podemos marcar o mesmo aspecto em Cesaréia; eles creram, e o Espírito Santo foi dado. Em Samaria, novamente, as mãos foram colocadas sobre os que creram, e o Espírito Santo foi dado. E uma das coisas mais interessantes no livro de atos é aquele incidente em Éfeso. Quando Paulo chegou a Éfeso, encontrou certos discípulos, e discerniu algo incomum na condição deles, que alguma coisa estava faltando. Paulo diz a eles: “Recebestes vós o Espírito Santo quando crestes?” (Atos 19:2; R.V.). Esta é a tradução correta, e não “desde que crestes”, como na Versão Autorizada. Isto, em si mesmo, presume que crer implica o receber o Espírito. As duas coisas caminham juntas. Paulo não conseguiu compreender bem a situação. Era algo anormal. Ali estavam aqueles que professavam crer em Cristo, e que, de certo modo tinham crido em Cristo, mas aquilo que deveria acompanhar a verdadeira fé não estava lá. Paulo se viu confrontado com uma condição que ele jamais tinha encontrado antes, e, ao colocar esta questão a eles, “Recebestes vós o Espírito Santo quando crestes?”, eles responderam: “Nem ainda ouvimos falar que haja Espírito Santo...” Então, Paulo pergunta novamente: “Em que fostes batizados então?” Ao que eles responderam: “No batismo de João”. Ah! Agora temos a pista. “João batizou com o batismo do arrependimento, dizendo ao povo que eles deviam crer naquele que viria após ele, isto é, em Jesus.” Assim, eles tinham sido batizados no batismo de João, para um objetivo futuro, Cristo; não batizados em Cristo, mas batizados em direção a Cristo. São dois tipos de batismos completamente diferentes. Paulo ordenou-lhes que fossem batizados em nome do Senhor Jesus, impôs as mãos sobre eles, e o Espírito Santo foi dado. Estas duas coisas caminham juntas. A união com Cristo implica o recebimento do Espírito. O Senhor não quer que isto aconteça mais tarde na vida espiritual; isto deve marcar o início.
Se no livro de atos há elementos particulares que colocam a questão toda em destaque, como sinais que acompanham, tais sinais foram apenas uma maneira de o Senhor enfatizar o significado de toda a dispensação, que a união com Cristo envolve o recebimento do Espírito Santo. Como você sabe? Bem, Ele tem mostrado isto a esta geração ao deixar o assunto em evidência desta maneira. Ele deixou tudo muito bem estabelecido, de modo que ninguém pode deixar de perceber. Se você se ocupar com os sinais (línguas, etc), mas perder o seu significado, irá fracassar em ver que estas marcas externas, estas demonstrações, apenas foram permitidas como acompanhamentos, a fim de enfatizar a verdade básica, ou seja, que a união com Cristo estava agora estabelecida. O dom do Espírito Santo foi o selo e a prova disto. Sobre que base? Ao crer em Cristo, ao ser batizado em Cristo, a vida eterna é recebida no Espírito Santo. E esta vida possui capacidades celestiais, dentro dela estão os poderes da era vindoura; e, quando nos séculos vindouros os seus poderes forem completamente liberados, seremos dotados de poderes que transcendem em muito os nossos poderes atuais. A era vindoura foi prefigurada através de sinais no princípio. Pode ser que de vez em quando tais poderes se manifestem na cura de um doente ainda hoje, mas não vamos nos agarrar a eles, nem fazer uma doutrina de sinais, não vamos reuni-los e sistematizá-los, fazendo deles o objeto da nossa busca. Lembremo-nos de que eles simbolizam algo maior, e você pode ter este “algo maior” independentemente dos sinais.
Quando realmente você é batizado em Cristo, você recebe o Espírito da vida de Cristo, e nesta vida você é trazido imediatamente para um relacionamento celestial com o Homem Celestial; você se torna parte do Homem corporativo (a igreja).
É o que Cristo é em nós pelo Espírito Santo que determina tudo. Determina todos os valores, estabelece para sempre a questão da eficácia, responde a todas as perguntas e problemas. Gostaria que tivéssemos este entendimento, este conhecimento, este conhecimento mais cedo. Se tão somente pudéssemos ter isto como fundamento de nossas vidas desde o início, de quanta coisa poderíamos ter nos livrado!
Ministério é a expressão da vida, e não a colocação de um uniforme, de um título. Uma vez pensei que estar no ministério era ir para um determinado tipo de obra, de negócio, e, bem, ser um ministro! É assim que se entra no negócio. Muitos e muitos estão se esforçando e labutando no ministério, quebrando seus corações, com medo de perder estas coisas, para não estar violando o que eles entendem ser um chamado Divino. Muitos outros não conseguem largar a coisa porque se tornou um meio de vida, e eles também estão partindo os seus corações. É tudo falso. Ministério não é um sistema como este. Ministério é a expressão da vida, o que, em outras palavras, seria dizer que ministério é o resultado da habitação de Cristo. Desastre está diante do homem ou da mulher que ministra em outro terreno que não neste. Quando o Senhor tem uma oportunidade em nós, e nós realmente confiamos nele, e assumimos a nossa posição, Ele irá nos mostrar que há ministério suficiente para nós; nós não precisaremos dar voltas, a fim de procurar ministério. A verdadeira obra muitas vezes é para nos levar a este terreno, onde temos a nossa libertação desta presente era má, até mesmo em sua concepção de ministério, e nos levar para o ministério celestial.
O Senhor Jesus é o nosso modelo. Você vê o ministério espontâneo e tranquilo deste Homem Celestial. Eu almejo isto! Não significa que iremos nos tornar negligentes, mas isto realmente nos livra de muita tensão desnecessária. Esta é a forma como deveria ser. Que o Senhor nos leve a isto; o Homem Celestial com a vida celestial, com o recurso celestial completo.
Em consonância com o desejo de T. Austin-Sparks de que aquilo que foi recebido de graça seja dado de graça, seus escritos não possuem copirraite. Portanto, você está livre para usá-los como desejar. Contudo, nós solicitamos que, se você desejar compartilhar escritos deste site com outros, por favor ofereça-os livremente - livres de mudanças, livres de custos e livres de direitos autorais.