por T. Austin-Sparks
Capítulo 6 – O Homem Celestial – A Inclusividade e Exclusividade de Jesus Cristo
Temos em consideração uma frase da carta aos efésios, “TODAS AS COISAS EM CRISTO”: “de tornar a convergir em Cristo todas as coisas, na plenitude dos tempos” (Efé. 1:10). Esta é a grande visão geral com a qual estamos ocupados, e iremos, agora, dividi-la em suas partes.
Para começar, é extremamente importante que possamos reconhecer que, para Deus, há um fator básico que governa todas as coisas, um fator muito importante para o nosso conhecimento, que é a inclusividade e exclusividade de Seu Filho, Jesus Cristo.
Tudo o que é necessário para a realização do propósito e intenção Divina está EM e COM Cristo, não apenas como depósito, mas tudo é Cristo. Esta é a inclusividade de Cristo.
Então, por outro lado, nada que não seja de Cristo será aceito ou permitido por Deus na questão final. Esta é a exclusividade de Cristo. Contudo, em Sua paciência e longanimidade, pode até parecer que Deus, em Sua graça e misericórdia, tolera muitas coisas, até mesmo em nós, povo Seu; no entanto, é de suprema importância entendermos de uma vez por todas que, no fundo, Ele não está realmente permitindo. Ele pode estender a nós a Sua tolerância, Sua longanimidade, mas Ele não está de forma alguma aceitando as coisas que não são de Cristo. Ele disse inicialmente que elas estão mortas para Ele, e Ele está progressivamente operando morte neste campo. Assim, esta é a questão final, nenhum fragmento daquilo que não é de Cristo será permitido. Cristo exclui tudo que não é dele. É assim que Deus trata o assunto.
Em vista do que acabamos de falar, é de extrema importância, para uma real efetividade, que possamos perceber que a igreja foi concebida para ser aquilo que Cristo foi, e é, como Homem Celestial. Somente aquilo que é de Cristo, o Homem Celestial, é eternamente eficiente. Portanto, quanto mais houver de Cristo, mais eficácia haverá, do ponto de vista de Deus. Isto significa que aquilo que era e é verdadeiro sobre Jesus, como Homem Celestial, quanto ao Seu Ser, quanto às leis da Sua vida, quanto ao Seu ministério e missão, deve ser verdade em relação à igreja. (Quando falamos da igreja, naturalmente, falamos de todos os membros que formam a igreja).
Você percebe que estamos falando de Cristo como sendo o Homem Celestial, e não de Sua co-igualdade com o Pai na Deidade. Não estamos dizendo que a igreja deve ser Deus encarnado, no mesmo sentido que Cristo o foi, e que ela deva ocupar o seu lugar na Deidade; estamos falando do Homem Celestial. Cristo foi, e é, um Homem Celestial. A igreja nele também é um homem celestial, um “novo homem”. Não devemos pensar nisto como sendo judeu ou grego, circuncisão ou incircuncisão, escravo ou livre, uma combinação de elementos terrenos, de vários aspectos da vida humana aqui nesta terra. Estas e outras distinções terrenas desaparecem de vista e são colocadas de lado, e um “novo homem” é trazido, onde “Cristo é tudo em todos”. (Col. 3:11).
Cristo nunca foi da terra, em Sua natureza essencial. Ele teve uma relação com Israel, com o homem aqui; Ele tem uma relação judicial com esta terra, mas, em Sua natureza essencial, Ele jamais foi terreno. Ele é o Senhor do Céu. Ele se esforça para salientar este fato, mantendo isto claramente à vista: “...Eu sou de cima...” (João 8:23).
E assim como Cristo, em sua natureza essencial, jamais foi da terra, também a igreja. A igreja nunca foi uma coisa terrena no pensamento de Deus. É aí que a lacuna é preenchida. Paulo nos leva para o princípio, mostrando que a igreja está nos lugares celestiais antes mesmo que a queda tivesse ocorrido. Em Cristo nós atravessamos a ruptura que fora criada pelas eras, devido a queda. Antes que o mundo existisse, Cristo já existia com o Pai, literalmente e pessoalmente. A igreja existia na presciência de Deus antes que o mundo fosse criado, embora não literalmente da mesma maneira que Cristo existia; isto é, não se trata de reencarnação, mas, na presciência de Deus, a igreja era tão real antes do tempo como o é agora, e como sempre será. Sempre que Paulo fala da igreja, ele fala como se ela estivesse completa. Ele nunca fala de um preenchimento dela. Muito precisa ser feito para que membros sejam acrescentados a ela, para que ela alcance sua completude numérica, sua perfeição espiritual e moral, mas, embora Paulo tenha muito a nos falar sobre crescimento e aumento espiritual, ele ainda fala da igreja como se ela já estivesse completa. Ele a vê a partir do ponto de vista Divino, eterno, celestial, do ponto de vista da presciência de Deus. Nesta presciência, nesta preordenação conforme a presciência, a igreja já existia como um todo completo com o Pai e com o Filho antes dos tempos eternos. Então surgiu o intervalo, a lacuna, o mergulho profundo; mas em Cristo a lacuna é preenchida, e a igreja é vista como algo que continua nos lugares celestiais, acima de tudo.
A igreja é vista como estando literalmente formada nesta dispensação, mas é imediatamente transladada para o céu. Imediatamente vamos para Cristo e nos assentamos nos lugares celestiais em Cristo: “Estando nós ainda mortos em nossas ofensas, nos vivificou juntamente com Cristo, e nos ressuscitou juntamente com Ele e nos fez assentar nos lugares celestiais, em Cristo Jesus”. Não diz que seremos colocados lá em algum tempo futuro. Antes mesmo que tivéssemos crido, já havíamos nos tornado um povo celestial, do ponto de vista de Deus. Fomos tirados do reino de trevas e transportados para o reino do Filho do Seu amor, deixando nós, assim, de sermos terrenos, imediatamente após termos ido a Cristo. Fomos elevados exatamente para o nível do propósito original, e conectados ao primeiro pensamento de Deus em Cristo. Tornamo-nos o homem celestial corporativo, do mesmo modo que Jesus é o Homem Celestial.
Somos instados a reconhecer a nossa ligação com o eterno e com o celestial, a considerar as coisas a partir daí. Não haveria esta terrível anomalia de “cristãos mundanos” se apenas isto fosse compreendido. Olhe para tudo isto que precisa ser tratado devido ao fracasso em manter o testemunho puro para o povo do Senhor. Cristãos mundanos! Que contradição ao pensamento Divino! Quão impossível é aceitar algo como isto! Vamos repetir, somos chamados a reconhecer a nossa ligação com o eterno e com o celestial, e a considerar as coisas a partir daí. Não é o caso de estarmos lutando, trabalhando e nos esforçando para ser um povo celestial; não é o caso de estarmos desejando tal estado, e esperando que algum dia isto venha a se concretizar; nós já somos um povo celestial, e devemos considerar tudo a partir deste ponto de vista.
O convertido, o filhinho de Deus, precisa se lembrar de que, através de sua união com Cristo, ele se torna completamente parte celestial de Cristo desde o início, ligado a tudo o que é celestial e eterno. Tudo aqui precisa ser como que vindo do outro reino. Isto precisa ser mantido à vista. Seríamos um tipo de crente muito diferente se isto fosse sempre mantido na linha da frente. Este é o ponto de vista de Deus, da mente de Deus.
Isto, então, leva-nos ao ponto em que este relacionamento eterno e celestial é retomado. Não é o início, mas a retomada em Cristo de algo que foi quebrado, interrompido, e que jamais deveria ter sofrido interrupção.
Antes de tratarmos do ponto de recomeço, vamos gastar mais alguns instantes e olhar um pouco mais para a implicação daquilo que já foi enfatizado. Nada que não seja de Cristo será permitido por Deus na edição final. Por ser isto verdadeiro, todas as atividades de Deus em disciplina são introduzidas e perseguidas. Toda a disciplina que vem devido ao fracasso, por exemplo, possui um objetivo. Segundo Deus, o fracasso é uma necessidade. A vida alcança um ponto, e, então, é incapaz de passar adiante; por um tempo há um prosseguir com certa medida de benção, e, então, o estado de coisas muda, o tipo de benção que se via é retido, e um estado de coisas se segue, aquele de absoluta necessidade por uma nova posição no Senhor. Não é que o Senhor abençoa aquilo que não é de Cristo durante tal período, mas que, em Sua graça e misericórdia, Ele nos abençoa, a fim de nos conduzir a Cristo: então quando chegamos a certo lugar onde adquirimos algum conhecimento do Senhor, então Deus suspende aquela benção externa, e atravessamos um período de prova, de consciência de fracasso, de derrota, de prisão, de desamparo, e logo somos achados neste terreno, dizendo: O que eu preciso é de um novo lugar no Senhor, de uma nova experiência com Ele, de um novo conhecimento dele. Tudo o que aconteceu foi muito maravilhoso, mas de nada serve agora; o que preciso é de uma nova posição no Senhor.
Será desta maneira até o fim. A experiência não se refere aos estágios iniciais apenas, mas prossegue durante todo o percurso. Quantos de nós temos clamado: Senhor, precisamos de uma nova posição! Por que isto? É a aplicação desta lei, que Deus não aceita nada que não seja de Cristo. Somente aquilo que é de Cristo pode ser eficaz, e a nossa experiência indica que esta mistura precisa desaparecer, a fim de dar lugar a Cristo. E o fracasso leva a isto.
A mesma coisa se aplica em relação à obra, aos grandes movimentos. A história de um movimento é semelhante ao do indivíduo. Até mesmo aquilo que foi abençoado por Deus alcança um ponto onde, como movimento, como instrumento coletivo, reconhece que os velhos tempos se passaram, e que, diante daquilo que se tem, uma nova posição é necessária. Infelizmente muitos tentam viver do passado, tentam continuar baseados numa reputação, numa história, e jamais reconhecem que as coisas mudaram e que Deus requer algo mais. Se apenas eles reconhecessem isto, quão glorioso seria o futuro, em termos de eficácia, muito mais do que fora o passado. Porém, aí você tem a interpretação da experiência. Embora isto seja entendido pelas pessoas envolvidas, o fato permanece, que Deus aplica esta lei, isto é, que no fim, quando tudo já tenha sido dito e feito, e quando todas estas eras atuais tiverem completado o seu curso, nas eras de Deus que ainda estão por vir, nada haverá que não seja Cristo. Ele está procurando trazer a igreja para este objetivo, ser a plenitude daquele que cumpre tudo em todos. Não pode haver plenitude de Cristo enquanto houver outra coisa no lugar.
Quão variada é a aplicação desta verdade! Quantos detalhes ela toca, e quão envergonhados isto poderia nos deixar! Se realmente olharmos para isto, se isto realmente atingir os nossos corações, seremos muito humilhados. Interiormente nos sentiremos totalmente indignados com nós mesmos à luz do que pensamos acerca da nossa própria afirmação, da nossa própria força, da nossa própria atividade nas coisas de Deus, de tudo aquilo que tem sido de nós mesmos neste terreno. O esforço só é eficaz na proporção em que representa uma medida de Cristo. Nós, povo fraco nesta terra, levantamo-nos e pensamos que somos alguma coisa! Que povo insignificante nós somos se formos vistos a partir dos lugares celestiais! O Senhor olha para nós aqui em baixo e nos vê tentando fazer nomes para nós mesmos nas coisas dele; dominando outras pessoas; tentando exercer nossa influência sobre elas; manipulando, pondo nossas mãos sobre as coisas. É tudo orgulho, presunção, ego, de alguma forma. Os aspectos disto são incontáveis. O Senhor olha para isto e diz: Não, isto não pertence a Cristo, portanto, na edição final, irá desaparecer! Este é o porquê de Ele nos quebrar, de nos esvaziar, de nos levar ao chão, ao lugar onde choramos movidos por uma profunda consciência de coração partido: Senhor, se Tu não fizeres isto, então será impossível! A menos que Tu fale a palavra, as minhas palavras serão inúteis! É por isto que Ele trabalha desta maneira. O Senhor, em Sua soberania, olha e cuida para que nos deparemos com muitas coisas que nos mantenham humildes.
O Senhor nos mantém humildes através das pessoas difíceis que Ele coloca à nossa volta, as quais Ele não remove, por mais que clamemos a Ele para que assim o faça, embora, nelas mesmas, tais pessoas estejam completamente erradas e representem uma aparente ameaça aos interesses do Senhor. Elas servem para nos manter humildes e dependentes do Senhor. O Senhor faz este tipo de coisa, tudo conforme esta lei, de que tudo em nós precisa ser de Cristo. Cristo enche o universo para Deus. Se Deus vê algo que não é de Cristo, aquilo não pode ter lugar. Somente Seu Filho pode preencher todas as coisas, o que exclui tudo mais. Oh, quão humildemente precisamos buscar o Senhor para que não haja nada de nós mesmos pressionando as pessoas – nem a nossa maneira de ser, nem os nossos maneirismos, nem a nossa presença, nem a nossa conduta, nem o nosso espírito, nem mesmo a nossa voz. O Espírito muitas vezes irá nos avaliar, a fim de nos fazer caminhar suavemente. Nenhum de nós tem atingido níveis tão altos nesta matéria, e devemos todos reconhecer o fracasso. O Espírito está tratando conosco desta maneira. Se até em nossa roupa, ou em qualquer outra coisa, somos vistos como criancinhas do Senhor, o Espírito Santo irá procurar nos levar a um lugar de sensibilidade, onde Ele possa dizer: Isto está colocando você em evidência! Isto vem de você mesmo! Cubra-se, esconda-se! Isto está excluindo a pessoa de Cristo!
Deus determinou, de eternidade em eternidade, que este universo seja preenchido com Cristo, o Homem Celestial, através daquele homem corporativo celestial unido a Ele, sendo Ele a Cabeça. Deus está se livrando do judeu e do grego que há em nós, e nos constituindo segundo Cristo, segundo a imagem de Seu Filho. Bendito seja Deus! Quando chegarmos ao lugar onde os últimos remanescentes e relíquias daquilo que não é de Cristo forem retirados de nós, então Ele irá se manifestar em nós; Ele virá para ser glorificado nos seus santos. É Cristo quem deve ser glorificado, não nós. Que o Senhor apresse este dia!
Em consonância com o desejo de T. Austin-Sparks de que aquilo que foi recebido de graça seja dado de graça, seus escritos não possuem copirraite. Portanto, você está livre para usá-los como desejar. Contudo, nós solicitamos que, se você desejar compartilhar escritos deste site com outros, por favor ofereça-os livremente - livres de mudanças, livres de custos e livres de direitos autorais.