por T. Austin-Sparks
Capítulo 5 – Cristo o Poder para a Nova Milícia
Leitura: Juízes 6: 11-14, 33-34; 7: 1-25; 8: 4, 22-23.
Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós. Em tudo somos atribulados, porém não angustiados; perplexos, porém não desanimados; perseguidos; porém não desamparados; abatidos, porém não destruídos; levando sempre no corpo o morrer de Jesus, para que também a sua vida se manifeste em nosso corpo. Porque nós, que vivemos, somos sempre entregues à morte por causa de Jesus, para que também a vida de Jesus se manifeste em nossa carne mortal. Tendo, porém, o mesmo espírito da fé, como está escrito: eu cri, por isso, é que falei. Também nós cremos; por isso, também falamos, sabendo que aquele que ressuscitou o Senhor Jesus também nos ressuscitará com Jesus e nos apresentará convosco. Porque todas as coisas existem por amor de vós, para que a graça, multiplicando-se, torne abundantes as ações de graças por meio de muitos, para a glória de Deus. Por isso, não desanimamos; pelo contrário, mesmo que o nosso homem exterior se corrompa, contudo, o nosso homem interior se renova de dia em dia. Porque a nossa leve e momentânea tribulação produz para nós eterno peso de glória, acima de toda comparação, não atentando nós nas coisas que se veem, mas nas que se não veem; porque as que se veem são temporais, e as que se não veem são eternas” (2 Cor. 4: 7-18).
Duvido pouco que a ideia de Gideão passou pela cabeça do Apóstolo no momento de escrever a sua segunda carta aos Coríntios, e a sua breve alusão a ele é deixada como um depósito que é na natureza de uma pista para um princípio espiritual. Conforme tomarmos estas passagens, acharemos que todas constituem um outro aspecto da revelação da glória de Deus na face de Jesus Cristo. Nesta conexão veremos Cristo como o poder da nova batalha.
Embora estaremos tendo em mente o tempo de Gideão, muita coisa terá que ser deixada sem tocar, e devemos ficar contentes apenas com obtermos as linhas principais da instrução. Por exemplo, não teremos tempo para qualquer explicação particular e detalhada do significado “dos Midianitas e os Amalequitas e todos os filhos do Leste”. Eles têm seus significados, e seus significados são muito iluminadores, mas nós simplesmente temos que deixar todos esses detalhes e conteúdo com a observação de que representam as forças que estão contra o testemunho puro do Senhor. Eles são os inimigos que têm a supremacia quando o povo do Senhor afunda para um nível mais baixo de vida espiritual. Assim foi nos dias dos Juízes. Por causa do baixo nível espiritual, várias forças antagonísticas ganharam a vantagem, e sujeitaram o povo do Senhor. Dentre aquelas forças estavam “os Midianitas e os Amalequitas, e todos os filhos do Leste”.
Existe uma coisa que podemos observar neles, que eles falam de uma mistura do que é positivamente mau e errado, não tendo nenhuma associação qualquer com o Senhor, e elementos que tinham tido algum tipo de relacionamento com as coisas de Deus. Os Amalequitas, por exemplo, não tinham nenhuma conexão natural qualquer com Israel, mas os Midianitas tiveram seu surgimento do relacionamento de Abraão e Quetura, então, você tem aí um tipo de conexão histórica com as coisas de Deus. Estas duas coisas, aquilo que tem uma conexão de antecedentes com coisas Divinas em associação com algo que está positiva e completamente fora de Deus, uma força constituída e combinada para destruir o testemunho puro, mantê-los em cativeiro.
É geralmente assim. Não são muitas vezes que o inimigo abertamente ganha esse domínio sobre o povo de Deus. É normalmente por uma aliança com alguma coisa histórica ou tradicional, por meio de algo que em algum lugar tem um relacionamento passado com as coisas de Deus, que ele ganha a sua vantagem. É a associação histórica e tradicional, não uma comunhão cem por cento pura com Deus.
Você perceberá que uma das características destas forças combinadas é que elas ficavam todo o tempo privando o povo de Deus da comida deles. Gideão estava malhando o trigo atrás da parede para escondê-lo deles. Estas forças estavam contra o próprio sustento e nutrição do povo de Deus, e isso em si mesmo tem um significado que no momento não podemos ficar a procurar; mas deixem o sábio aprender.
Portanto, o conflito aqui é para um testemunho verdadeiro e puro no povo do Senhor. Isso é o que surge como o ponto controverso. Toda a questão e ponto controverso aqui é o do testemunho do Senhor em pureza e plenitude sendo achado na vida do Seu povo, e expresso através dele, ou ministrado por ele, e é contra isto que estas forças estão. O Senhor entra no assunto, e o que temos a notar é como o poder de Deus é exercido em relação ao testemunho pleno e puro de Sua glória, ou, em outras palavras, como a luz do conhecimento da glória de Deus é restaurada num dia de declínio espiritual; por que meios, e de que maneira, o poder de Deus é manifesto para a exibição do conhecimento da Sua glória.
Vendo qual é a questão, o que está em vista, somos capazes de analisar aquilo para o qual uma alusão é feita, a saber, Gideão como instrumento de Deus. Primeiramente, todos percebemos qual era a concepção que Gideão tinha de si mesmo, o que ele mesmo por natureza é estabelecido como sendo: “sou o menor na casa dos meus pais”. Isso é suficiente – o menor, mas fiel. Se você é fiel, embora você possa ser o menor, Deus tem Seus olhos em você, em relação a um propósito muito precioso para Ele mesmo. Fidelidade é aquilo que faz um homem grande à vista de Deus, não o que o homem é em si mesmo. O Senhor, por Sua parte, é ouvido dizendo a um desses, “o Senhor é contigo, homem valoroso”. Não é por causa do que o homem é em si mesmo, é a avaliação dada a ele em virtude de sua fidelidade aos pensamentos de Deus, o testemunho de Deus; a sua fidelidade, embora escondida e secreta, exercida em relação ao que Deus quer para Seu povo.
A seguir, olhemos ao exército de Gideão. Primeiramente, de trinta e dois mil é reduzido de um golpe a dez mil, e depois com mais um golpe da mão foi reduzido de dez mil para trezentos.
Agora, olhe novamente para Gideão, um homem sem nenhuma estima na sua própria visão, rodeado por trinta e dois mil homens como seu meio e instrumento. Ele poderia ter olhando para os trinta e dois mil e sentido um senso de confiança subindo, certeza, força. Enquanto olhava para esse grande exército poderia haver no seu coração algum sentimento de que havia algo que poderia ser útil, algo não tão pequeno, não tão desprezado, um instrumento que valeria a pena. Então Deus com um golpe de Sua mão retirou vinte e dois mil. Gideão olhou novamente aos dez mil. É um golpe terrível, um golpe devastador, tirar dois mil de um só golpe! Bem, dez mil com a benção de Deus pode ir muito longe! Então o Senhor moveu a sua mão de novo, e Gideão foi despojado de tudo menos trezentos. Mas foi o Senhor quem o fez, e Gideão sabia que era o Senhor. Não foi um acidente, um infortúnio, uma calamidade, foi o Senhor; e porque Gideão sabia que foi o Senhor ele continuou, e não desistiu.
O instrumento, então, foi despido. Em primeiro lugar foi despido de toda divisão do coração, e depois, de todo interesse pessoal. Quando um homem se ajoelha e se satisfaz, ele não está numa atitude desejosa de continuar com o assunto do Senhor para a glória de Deus; ele está se satisfazendo, denunciando que ele tem interesses pessoais a satisfazer, preocupações pessoais a servir. Mas aqui trezentos permaneceram em pé. Eles simplesmente tomaram a água nas suas mãos e a lamberam, com vontade de continuar. O instrumento é despido de todo interesse pessoal. Nenhum membro dessa companhia tomaria a glória para si mesmo. É despido para a posição em que não há nenhum terreno algum para se gloriar na carne, nenhum terreno de qualquer grande sucesso sobre o qual poderia se dizer que suportaria, humanamente nada em todo o mundo que poderia contar para o triunfo. Trezentos contra os Midianitas e os Amalequitas e todos os filhos do Leste, como gafanhotos vinham em multidão, tanto eles como seus camelos eram inumeráveis! Então não há nenhum terreno aqui para qualquer coisa menos a luz do conhecimento da glória de Deus. Algo de Deus está vindo à luz aqui. Aqui há uma oportunidade de fato, uma excelente ocasião. A ocasião para a carne tomar algo da glória é anulado. “Não seja caso que Israel se glorie contra mim”, ou seja, tirar a Minha glória de Mim. Deus está assegurando a Sua glória por este despojamento.
A lição que é claramente trazida para nós é que o Senhor somente foi o poder. O poder era para ser de Deus. A suprema grandeza do poder é “de Deus e não de nós mesmos”.
Isto é ainda mais visto pelo equipamento: vasos de barro com lâmpadas dentro, uma espada, e uma trombeta. Um vaso, mas um vaso de frágil barro: uma luz dentro, sustentado pelo óleo do Espírito, uma iluminação interna; a Palavra de Deus, a espada do Espírito; a palavra do testemunho deles, a trombeta. E mais uma coisa, um pão de cevada! Que grande a importância que essa cevada teve em todo este drama. Era apenas um pão de cevada, mas transformou tudo.
Voltemos para a segunda carta aos Coríntios, e veja o que Paulo diz acerca de tudo isto que temos mencionado em conexão com Gideão. "Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus, e não de nós" (2 Cor. 4:7) - tesouros em vasos de barro. O que são esses vasos? "Por isso não desfalecemos; mas, ainda que o nosso homem exterior se corrompa, o interior, contudo, se renova de dia em dia" (2 Cor. 4:16) - o homem exterior está se corrompendo. "Sabemos que se a nossa casa terrestre deste tabernáculo se desfizer..." (2 Cor. 5:1). Então, claramente, os vasos de Gideão, entendidos espiritualmente, são corpos humanos frágeis. Depois, a lâmpada ou a luz. Este é o resplendor nos nossos corações por Deus, quem disse: "Das trevas resplandecerá a luz, é quem resplandeceu em nossos corações, para iluminação do conhecimento da glória de Deus na face de Jesus Cristo". A lâmpada ou a luz é o resplendor de Deus nos nossos corações pelo Espírito.
A espada. Paulo deixa bastante claro o que é isso. "Porque nãos somos, como muitos, falsificadores da Palavra de Deus, antes, falamos de Cristo com sinceridade, como de Deus na presença de Deus" (2 Cor. 4:2) - "Antes, rejeitamos as coisas que por vergonha se ocultam, não andando com astúcia nem falsificando a palavra de Deus..."(2 Cor. 4:2). A espada é a Palavra de Deus.
A trombeta. Temos dito que a trombeta representa a palavra do testemunho deles. O que é isso? "Porque não nos pregamos a nós mesmos, mas a Cristo Jesus, o Senhor; e nós mesmos somos vossos servos por amor de Jesus". (2 Cor. 4:5) "farás soar a trombeta fortemente e por toda a terra. Jesus Cristo é Senhor".
O pão de cevada. "Portanto já em nós mesmos tínhamos a sentença de morte, para que não confiássemos em nós, mas em Deus, que ressuscita os mortos" (2 Cor. 1:9). - "Sabendo que aquele que ressuscitou o Senhor Jesus, nos ressuscitará a nós com Jesus, e nos apresentará convosco" (2 Cor. 4:14). O pão de cevada é sempre um tipo de ressurreição, e Cristo no poder da ressurreição transforma tudo. Cristo em poder ressurreto é suficiente para resolver todo o problema dos Midianitas e dos Amalequitas e de todos os filhos do Leste. Que importância esse pão de cevada teve! É "Deus quem ressuscita os mortos", ou, em outras palavras, Cristo em vida de ressurreição em nós que é representado. "E, se o Espírito daquele que dos mortos ressuscitou a Jesus habita em vós, aquele que dos mortos ressuscitou a Cristo Jesus há de vivificar também os vossos corpos mortais, pelo seu Espírito que em vós habita" - o pão de cevada, o poder da ressurreição.
A perseguição. Diz que Gideão e seus homens perseguiram ainda que fatigados. O que Paulo diz disso? "Por isso, não desfalecemos; mas, ainda que o nosso homem exterior se corrompa, o interior, contudo, se renova de dia em dia" (2 Cor. 4:16) - renovação interior por Cristo em vida ressurreta. "Ora, quem para isto mesmo nos preparou foi Deus, o qual nos deu como penhor o Espírito" (2 Cor. 5:5).
Paulo abrange todo esse terreno conetado com Gideão, toma todos estes elementos, os transfere para o Senhor Jesus, e diz, a iluminação do conhecimento da glória de Deus na face de Jesus Cristo é para os nossos corações por revelação.
Qual foi o resultado de tudo com Gideão? Gideão e seus trezentos varreram a área, quebraram a tirania do inimigo, libertaram o povo do Senhor, trouxeram eles de volta a uma posição de ascendência, à posição onde a glória de Deus era mais uma vez revelada neles.
A única coisa que resultou foi a liderança do Senhor. Israel foi até Gideão e disse, "Domina sobre nós, tanto tu, como teu filho e o filho de teu filho". Porém Gideão disse: Sobre vós eu não dominarei, nem tampouco meu filho sobre vós dominará; o Senhor sobre vós dominará. "Porque não nos pregamos a nós mesmos, mas a Cristo Jesus, o Senhor", diz o Apóstolo.
Agora, tudo isto, retomado em Cristo para ser revelado em nós, constitui o poder de Deus para esta nova milícia da restauração e estabelecimento, um testemunho pleno e puro para o Senhor mesmo no Seu povo. Ó, que grande a milícia é! Se você está apenas defendendo uma parte do testemunho você não enfrentará o mesmo conflito. Se você for meramente numa única linha do testemunho você não terá a mesma grande pressão, embora você possa tê-la em certa medida. Mas se, no propósito de Deus, você é um vaso, individualmente ou coletivamente, relacionado a todo o Seu testemunho, Seu testemunho em plenitude e em pureza, sem mistura, então você será lançado numa milícia terrível. A batalha será renhida. Todas as poderosas hostes das trevas se concentrarão para fazer com que essa restauração seja impossível. Não existe dúvida acerca disso. Sempre tem sido assim.
Paulo é um homem à procura do pleno testemunho. Não poderia haver testemunho parcial com ele. Outros nem tão longe chegam, podem permanecer em terreno judaico, e não serem dos que seguem em frente, mas Paulo não permanecerá em nenhum terreno mais baixo e menor do que o pleno, o testemunho completo do absoluto Senhorio de Jesus Cristo na Igreja que é o Seu Corpo, e no universo. De modo que o resultado é conflito.
Como triunfará Deus? Para o triunfo de Deus é necessário que em semelhante situação Ele tenha todo o terreno para Si mesmo, e por isso Ele permitia os sofrimentos, o despojamento. Ele tirava cada terreno para se gloriar na carne, e trazia o vaso para um estado muito frágil. O Apóstolo viu o significado disso. Como Gideão, ele sabia que era o Senhor quem o estava fazendo, o Senhor quem o estava quebrando, esvaziando, enfraquecendo, despojando, e ele ressume tudo nestas palavras: "Temos, porém, este tesouro em vasos de frágil barro". Este é o objetivo deliberado por parte de Deus, isto não é um acidente, não é só algo que nos acontece por acaso; existe um objetivo definido na mente de Deus. "Temos, porém, este tesouro em vasos de frágil barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós mesmo". Esse é o caminho no qual a iluminação do conhecimento da glória de Deus vem. É um caminho de sofrimento, de conflito, mas é um caminho no qual Cristo como a excelência do poder de Deus chega a ser conhecido na Sua liderança.
Devemos ser consolados, encorajados, fortalecidos, embora não seja de fato um prospecto no qual a carne possa ter algum prazer. Nesse terreno podemos estar de fato em temor e em grande tremor, podemos certamente esquivar-nos de tudo que está envolvido. Mas vamos, como Paulo, desviar o nosso olhar das coisas visíveis e assinalar que toda esta aflição, quando vista à luz do invisível, do eterno, é uma leve aflição momentânea; está produzindo um peso de glória eterno mui excelente.
Como dissemos, este é o caminho no qual a última e plena glória de Deus vai ser exibida através de nós. Como estão as forças do mal enfrentando o impacto de Cristo agora? Através de pessoas que contam para alguma coisa? Através de pessoas que são poderosas? Através de pessoas em quem você pode olhar e dizer, este é um grande povo? Não! Nunca! Se eles já foram alguma coisa neles mesmos, Deus teria se esforçado para ver que eles tinham que abandonar esse terreno e que agora neles mesmos eles são como nada. Tome Paulo no tempo em que escreveu esta carta, e pergunte-lhe qual valor natural pode agora ser colocado na sua vida. Ele lhe dirá que não é tido em conta, excluído. Ao mesmo tempo ele será ouvido dizer que "o nosso homem interior se renova de dia em dia". Me glorio no fato de que, embora Paulo passasse por tão grandes sofrimentos - e nós de nenhuma maneira sabemos de tudo que lhe sobreveio, e de quantas vezes ele ficava, como diríamos, à beira da morte - ele nunca era arrancado, ele nunca morria; ele deu a sua vida, nunca foi tirada dele. Quando o tempo chegou para Paulo deixar este local de seu serviço, ele disse, "terminei a minha carreira..."; "Estou sendo agora oferecido, e o tempo da minha partida está próximo". Ele é um homem em possessão da oferta. Como seu Mestre, ele poderia dizer, "Nenhum homem a tira de mim, mas eu a dou por mim mesmo". Quando você vê o pano de fundo, então você sabe que isto é uma revelação da glória de Deus, o poder da vida ressurreta do Senhor. É assim como o inimigo é lutado e destruído. É uma revelação gloriosa do que Cristo é. É a iluminação do conhecimento da glória de Deus na face de Jesus Cristo nos nossos corações, e nestes vasos de frágil barro, quando o tesouro está neles.
Que o Senhor possa tornar tudo isto realidade; não uma bonita meditação ou contemplação, mas algo do qual é tomado posse pela nossa fé, a saber, Cristo a nossa vida.
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