por T. Austin-Sparks
Capítulo 4 – Algumas Dificuldades Mentais na Oração
Depois de considerarmos as cinco fases da oração, a saber: comunhão, submissão, petição, cooperação e o conflito, avançaremos um pouco mais considerando alguns dos problemas relacionados à oração. Como dissemos, é muito frequente que um senso indefinido de contradição ou incerteza paralise nossas mentes quando oramos. Somos, algumas vezes, impedidos por certas dificuldades mentais que jamais nos propusemos seriamente a analisar. Nosso objetivo então, é tentar definir algumas dessas dificuldades, analisá-las até chegarmos a uma conclusão, permitindo dessa forma a manutenção de um caminho limpo para nossa oração em certeza e confiança.
Uma das principais dificuldades na oração surge com relação à vontade de Deus. Isto, naturalmente, é uma esfera muito ampla de contemplação e consideração, e inclui inúmeras fases, aspectos e pontos, mas nós iremos procurar estreitar nossa análise, e, na medida em que avançarmos, veremos que há muito mais envolvido naquilo que dizemos.
A questão básica seria em relação à Sua vontade. A grande dúvida aqui seria se a vontade de Deus para nós é absoluta ou relativa? Quando falo assim, pode não ajudar muito. Soa muito acadêmico, mas vou explicar.
Será que Deus permite as coisas nos acontecerem porque são Sua vontade absoluta, ou porque Ele nos atrai por meio delas para uma determinada posição? Neste último exemplo a vontade de Deus seria relativa, não absoluta, ou seja, as coisas que nos acometem não representam a vontade absoluta de Deus, mas Ele permite que elas ocorram com foco em outros propósitos, e assim, elas representam Sua vontade relativa.
Então temos o fundamento e a base para uma consideração mais abrangente da vontade de Deus em relação à oração. Se estamos tratando com a vontade relativa de Deus, a questão será se tais coisas, tendo cumprido os propósitos a ela designados, serão colocadas de lado e deixarão de ter espaço na vontade de Deus, ou se será a elas permitido permanecer, enquanto que nós estaremos em uma posição de ascendência, quando elas se tornam nossas servas. Essas coisas permanecem, mas não porque Deus, na plenitude de Sua vontade e propósito deseja que ali estejam. Ele vê que a permanência delas é necessária para nos manter numa certa posição.
Se fôssemos criaturas perfeitas, a vontade de Deus seria sempre absoluta. Não haveria lugar para a vontade relativa de Deus, pois seria desnecessário a Ele permitir que tais acontecimentos ocorressem para nos dirigir a novas posições. Porém, sendo imperfeitos, criaturas caídas, a vontade de Deus para nós é muito mais frequentemente relativa do que absoluta.
Então temos o problema relacionado à submissão e importunação. Essas duas coisas parecem ser antagônicas, representando uma contradição. Como reconciliar importunação com submissão? A importunação não implica na falta de submissão? A submissão não demanda pela não importunação? Elas parecem se anular, por serem de natureza contrária, contudo, não é bem assim. O problema que encontramos na oração é como continuar batendo, e ainda assim permanecer submisso. Será que a submissão não enfraquece nossa força, quando batemos à porta? Quando batemos muito forte, isso não implica na falta de aprendizado da submissão? Nem sempre isto é definido mentalmente dessa forma, entretanto essa ideia penetra ali no fundo, e tende, muito frequentemente, a tirar nossa positividade, certeza e determinação na oração, até o ponto em que nos encontramos numa terra de ninguém.
Existem coisas a ser vencidas ou superadas em nós, e isto significa que dentro da esfera da vontade relativa de Deus existirão muitas coisas que serão permitidas, ou enviadas pelo Senhor para nossa vida com o objetivo e propósito de gerar certas coisas em nós, ou nos fazer passar por certas coisas, por nós mesmos, na busca de fatores morais (estou usando a palavra ‘moral’ no sentido amplo, não no sentido restrito). Precisamos reconhecer que a nova criação envolve uma questão moral e não está terminada em relação a nós. Apesar dessa obra estar perfeita e completa em si mesma, não está completa em nós. A velha criação ainda existe, e apesar de ser objetiva e exterior comparando-a à nova criação, ela ainda exerce grande influência sobre a nova.
O pecado não está extinto, o mundo não é algo hipotético, nem o diabo está extinto para o cristão! Entretanto, bem no centro da velha criação temos a nova criação, que é algo moral. Talvez seja um elemento moral em sua infância, por assim dizer, com todos os seus elementos e fatores a ser desenvolvidos até que nos tornemos criaturas morais, no sentido pleno da palavra: responsáveis, inteligentes, com uma nova consciência, um novo padrão de valores e um novo reconhecimento de princípios. Um novo mundo celestial entrou em cena, e seu conhecimento e sabedoria precisam ser possuídos de forma inteligente. Seus segredos devem ser conhecidos e suas virtudes precisam ser forjadas em nosso interior. O Senhor não nos torna em simples máquinas por meio da regeneração, que serão acionadas sem qualquer consideração a nossa vontade, sentimentos, desejos, razão e inteligência, sendo carregadas de cá para lá e forçadas a fazerem coisas, sem qualquer referência pessoal. Isto é completamente contrário às Escrituras.
Mas o Senhor nos constituiu em criaturas morais segundo uma nova moralidade, um novo sistema celestial e uma inteligência completamente nova que não pertence ao homem natural. Temos um sistema inteiramente novo de julgamentos, valores e avaliações, e em todas as coisas o Senhor irá agora se reportar a nós. Ele irá nos convidar a exercitar a nós mesmos em relação à nova impressão, consciência, convicção do interior dessa nova criação.
Assim, a nova criação é algo moral, mas uma vez que a velha criação ainda a envolve, a nova criação irá crescer por meio da conquista, do conflito, e do exercício árduo para subjugar a velha criação, sujeitando-a, triunfando sobre ela, isto por meio de aplicação deliberada, ardorosa, devotada e persistente.
A vontade renovada, energizada pelo Espírito Santo, não será acionada de forma mecânica, mas será convidada a se exercitar no Senhor. Orar na vontade de Deus não significa que o Espírito Santo vem e toma posse de sua vontade, forçando-o a falar coisas sem seu entendimento. Essa é uma base falsa. Há muito disso hoje, quando o entendimento do homem é colocado de lado e ele começa a derramar todo tipo de coisas que, nem ele, nem ninguém mais conseguem compreender, porém não é assim com a nova criação. O Espírito Santo não suspende a inteligência e compreensão de alguém que Ele usa, mas Ele convida essa pessoa ao exercício de seu entendimento. “Orarei com o espírito, mas também orarei com a mente” [1Co 14:15], disse o Apóstolo, e orar no Espírito Santo não significa que nós cedemos tudo a Ele até o ponto de perdermos a nossa própria vida moral (usando esta palavra novamente em seu sentido mais amplo).
Vendo, então, que as questões morais são proeminentes no propósito do Senhor em relação a nós, a oração se torna num processo de educação, treinamento. Falamos da ‘escola da oração’, e esta é uma designação correta. Educação e treinamento, no entanto, não são coisas semelhantes. Educação refere-se à obtenção de conhecimento, e treinamento se relaciona ao valor moral na expressão prática. Esta definição é muito importante. Quando falamos de uma ‘pessoa educada’, nos referimos a alguém que conhece muito, porém, referir-se à ‘alguém bem treinado’ representa que essa pessoa tem valor no sentido prático. Há uma porção de pessoas educadas, mas completamente inúteis.
Somos, portanto, atraídos à oração, e o Senhor Jesus se assegura que sejamos estendidos e prolongamos em oração, representando que, por um lado, obteremos conhecimento espiritual. Esse conhecimento espiritual não será obtido, a menos que a oração seja prolongada. É notável como aprendemos coisas, quando existe um período extenso de oração, e alcançamos segredos, obtendo conhecimento a respeito das coisas. E, então, por outro lado, esta atração para a oração tem o efeito de treinamento, trazendo-nos para uma posição moral e para um nível moral mais elevado. Pessoas que não oram serão tanto ignorantes quanto fracas, mal-educadas e destreinadas. Elas não conhecerão o propósito de Deus, nem serão capazes de agir conforme Sua vontade.
Portanto, devemos reconhecer que a oração não se refere meramente a uma vantagem pessoal, mas é o tomar parte numa campanha. Há um esquema Divino de coisas no qual devemos tomar parte. A oração não tem meramente um valor pessoal e subjetivo. É algo objetivo, coletivo e relativo, mesmo em valores morais que resultam dessas orações individuais.
Vamos, então, resumir alguns pontos. Existem três lados na oração impertinente, mas será que compreendemos por que a importunação é demandada, necessária e correta? Você percebe que não há contradição entre sujeição e importunação? A submissão, como salientamos anteriormente, é ativa, positiva, nada passiva. É o processo de entrar em linha com o propósito Divino; e, então, a importunação se segue no desenvolvimento dos aspectos morais.
Como mencionamos, existem três lados da oração impertinente. Primeiro, temos o lado moral, e este se divide em dois aspectos. Falamos dos ingredientes do incenso que era oferecido sobre o altar de ouro, e dissemos que esses ingredientes representavam as virtudes morais de Cristo. Por um lado, essas virtudes precisam ser apreendidas e apropriadas pela fé, e este é um aspecto do lado moral da oração de importunação: que a fé deliberada e persistentemente apreende e se apropria das virtudes morais e glórias do Senhor Jesus. Esse é um exercício, e frequentemente significa abandonar a intromissão daqueles argumentos levantados pelo nosso homem natural, que desencorajam a oração. Quando entramos na presença do Senhor, deveríamos certamente ter um senso de nossa própria indignidade, vazio e fraqueza, mas preciso deixar claro que esse não é o terreno do nosso exercício. A oração eficaz é interferida, paralisada e até mesmo impedida pela obsessão persistente com os nossos próprios pecados, fraquezas e impotência, e existe uma necessidade de exercício positivo nas virtudes morais e nas excelências de Cristo, para que possamos tê-las em nossas mãos para nos achegarmos diante de Deus.
O inimigo irá introduzir acusações e condenações na presença de Deus, mas precisaremos nos agarrar, com ambas as mãos, às excelências do Senhor Jesus, e enquanto não o fizermos, não chegaremos até o trono, porque não poderemos chegar lá sem essas excelências. Deve haver uma recusa deliberada de receber essa acusação. No caso de algumas pessoas, a vida de oração foi perdida e se tornou impossível, porque imediatamente ao se colocarem em oração sobrevinha uma invasão de introspecção, autoanálise, forte consciência de si mesmo e de suas faltas, de modo que essas pessoas nunca conseguiram alcançar algo positivo.
Por um lado, então, temos o exercício e a persistência da fé na apropriação daqueles ingredientes, das excelências e virtudes do Senhor Jesus, para chegarmos diante de Deus.
Então temos outro aspecto desse do fator moral: essas excelências e virtudes precisam ser forjadas em nossas próprias almas, pelo Espírito Santo. O Senhor Jesus na presença de Deus é o Homem segundo o coração de Deus representativo. Entretanto, Ele não se limita a ser apenas nosso representante, mas é o Homem de Quem todos os membros da nova criação em Cristo precisam assumir o caráter. Todas as virtudes e excelências desse Homem perfeito devem ser distribuídas a todos os Seus membros, de modo que eles se tornem participantes de Sua natureza em suas próprias almas. Essas virtudes de Cristo foram provadas, testadas, triunfaram, e são virtudes poderosas, não se tratando de algo meramente passivo. O Senhor Jesus (digo isso com reverência) não foi colocado num museu como um modelo, um espécime supremo apenas para ser olhado e admirado, mas existe uma força e realidade Nele. Ele vive, não é um modelo ou uma estátua. Ele é o Cristo vivo que transmite da Sua vida, por meio do Espírito Santo a nós, Seus membros. Sua fé não é apenas algo completo, aperfeiçoado e polido, para ser observado como um espécime bonito. É uma fé por meio da qual devemos viver. O mesmo acontece com Sua paciência. Somos chamados para ser companheiros e participantes da paciência de Cristo. Ao mencionar essas coisas, logo diversas porções das Escrituras passam pela nossa mente: "associai com a vossa fé a virtude” [2Pe 1:5]. Associai, associai, associai – e essas são virtudes de Cristo acrescentadas em nós.
Somos chamados, diz o Apóstolo, para ser “participantes de Cristo” [Hb 3:14]. Dessa forma, Sua fé, paciência, devoção, obediência, sofrimento e amor foram todos provados, e triunfaram, mas não são consideradas coisas desassociadas, são ligadas a nós. "Pelas quais nos têm sido doadas as suas preciosas e mui grandes promessas, para que por elas vos torneis co-participantes da natureza divina” [2Pe 1:4].
O lado moral da oração impertinente, então, é que as virtudes e excelências de Cristo são forjadas em nós. Quando a importunação representa a necessidade de paciência porque Deus não responde nossas orações, nem hoje ou amanhã, nem talvez na próxima semana, mês, ou ano, o que será que Ele está fazendo? Está forjando em nós, nesse processo, as excelências morais de Seu Filho: fé, paciência, devoção e obediência aperfeiçoadas e triunfantes. A oração é verdadeiramente um treinamento! Essas virtudes vêm por meio de exercício. Vamos nos lembrar de que Deus tem um propósito moral em vista, e para isso fomos chamados a ser participantes de Cristo. Portanto, a vontade relativa de Deus tem a ver com caráter. O pecado não é a vontade absoluta de Deus, mas Ele o permitiu. Mas o relacionamento ocorre por meio da nossa conquista, e do desenvolvimento da vida moral da nova criação. O sofrimento não é a vontade absoluta de Deus, mas Ele de fato o tem permitido. É, portanto, Sua vontade relativa, que representa que Sua permissão e consentimento têm um propósito. Quando este propósito é alcançado, o sofrimento pode ir embora, ou pode até ser permitido a ele permanecer para nos manter numa certa posição, mas o importante é que a posição intencionada por Deus seja por nós alcançada, de modo que a vontade relativa de Deus se cumpra. Isso se aplica a tudo. As circunstâncias, por exemplo. Muitas dessas circunstâncias que nos acometem não são a vontade absoluta de Deus. Um colapso não é a vontade absoluta de Deus, mas como nada pode acontecer a qualquer filho Seu sem o Seu consentimento, é Sua vontade permissiva.
Isso então levanta a questão de buscar, em oração, conhecer o sentido da vontade de Deus nas coisas. Esta é a nossa educação. O nosso treinamento é conhecer o sentido daquilo que Deus quer nas coisas pelas quais oramos, através do exercício profundo do coração e das dores de parto. Uma vez que alcançamos um padrão mais elevado de vida, o segundo ponto na oração de importunação é o conhecimento. Em primeiro lugar temos a vida moral, e em segundo, o conhecimento.
Alguns se colocam inteiramente nas mãos de Deus, e são conduzidos a experiências estranhas de aparente contradição. Pode haver um senso claro do que o Senhor deseja fazer, mas uma impossibilidade absoluta para fazê-lo! Nenhum caminho é aberto, todas as portas são fechadas. Adiamentos e atrasos! O que o Senhor está fazendo? O primeiro efeito seria nos atrair para a oração, devemos nos estender ao máximo na importunação. Não podemos fazer diferente. Podemos decidir deixar tudo com o Senhor, mas nos encontraremos voltando repetidamente a esse assunto, e o Senhor não irá nos permitir ficar indiferentes. Bem, Ele busca um conhecimento e entendimento mais plenos da nossa parte. Isto está associado com todos os caminhos do Senhor conosco, e é uma coisa, que, naturalmente, conhecemos pela experiência, mas deve ficar claramente definida em nossas mentes: não poderemos aprender princípios Divinos, ou obter conhecimento espiritual a partir de livros ou palestras. Eles apenas podem ser conhecidos na medida em que forem gerados. Acima de tudo precisa haver a concepção, que é algo interior; então, deve haver a formação, e, finalmente haverá as dores de parto, conduzindo ao nascimento. É um processo da vida. Não podemos aprender coisas Divinas e espirituais a partir de manuais, nem mesmo da Bíblia. Apenas aprenderemos o que está na Bíblia ao longo de experiências vivas. A Bíblia não é um gramofone; mas um microfone. Qual é a diferença? Um gramofone é algo que tem tudo armazenado em si mesmo. Um microfone é aquilo que transmite algo adiante. A Bíblia não é um gramofone. Devemos receber coisas além da nossa compreensão em nossa leitura da Palavra. Podemos ter o conhecimento da Bíblia do tipo gramofone, isto é, podemos conhecer a Bíblia como um livro de capa a capa, podemos ter as análises e diagramas mais maravilhosos, e ainda ser de muito pouca utilidade para o Senhor, no que tange aos propósitos práticos e espirituais, de forma viva.
Porém, se tivermos uma compreensão da Palavra como de um microfone, teremos as Escrituras, sim, porém mais do que isto, Deus nos falará através das Escrituras e teremos algo vivo a partir delas. Todos nós, como crianças na praia, já apanhamos conchas e as colocamos na orelha para ouvir o som do mar. Trazemos as conchas para as nossas casas na cidade e as colocamos nos nossos ouvidos, e ainda ouvimos o barulho do mar. Mas será que isso é real? É uma desilusão infantil. Quando éramos crianças pensávamos que se tínhamos a concha na cidade e ouvíamos o barulho do mar, aquele som estava armazenado dentro da concha e bastava colocá-la nos ouvidos – nós o ouvíamos. Este é um pensamento infantil em relação à concha, mas a coisa não funciona desta maneira. Aquela concha está apenas agindo como um funil que coleta as vibrações dos sons na atmosfera, nos fazendo ouvir aquilo que não ouviríamos somente com os ouvidos. A concha não passa de um transmissor de algo maior.
A Palavra de Deus tomada como um livro é exatamente como aquela concha. Se estivermos no Espírito, ela nos trará a mente do Senhor, mas, separados da operação do Espírito, a Bíblia pode ser como um livro qualquer e nós podemos lê-la sem obter nenhuma luz a partir dela, da mesma forma que acontece com qualquer outro livro. A necessidade é de conhecimento espiritual, porém muitos fazem da Bíblia apenas um manual.
O que quero dizer é que não podemos conhecer princípios Divinos ou obter conhecimento espiritual a partir de livros ou palestras. Esses princípios somente vêm a nós ao longo da linha da vida e da experiência. Um caráter vivo é formado em nós, uma vida é desenvolvida, e, então, entramos em dores de parto para sua manifestação. É assim que obtemos conhecimento espiritual. Ele vem por meio de oração perseverante, e este é o porquê de Deus exigir e tornar a oração persistente necessária. Começamos a conhecer coisas espirituais a partir das dores de parto de nossas almas diante de Deus, em longas experiências de angústia. Muitas vezes a pressa apenas representa perda de tempo, e acabamos obrigados a voltar atrás para obter o pleno conhecimento, porque nos apressamos. O Senhor precisa trazer muitas pessoas de volta, amarrando-as a ponto de não poderem se mexer, e mantê-las em exercícios profundos por um longo período de tempo. Então, elas aprendem aquilo que na mente do Senhor era indispensável. Há aqueles que aprendem antes de saírem, mas, seja antes de ir, ou seja necessário voltar atrás, o objetivo do Senhor permanece - que possamos conhecer.
Assim, a demora do Senhor é o Seu tempo de nos atrair para a oração persistente, pelo conhecimento espiritual.
Então, em terceiro lugar, temos o aspecto coletivo. Neemias menciona a oração que ele fez dia e noite, mas aquela oração era relativa, pois se relacionava com o povo do Senhor. As orações de Cristo tomavam o mesmo caráter. Elas não eram somente em favor de Si mesmo, mas estavam relacionadas aos Seus e foram estendidas por dias e noites a seu favor. As orações de Paulo claramente eram da mesma ordem: “não cesso de orar por vós”; "orando sempre com toda oração e súplica... por todos os santos”. Vemos persistência e importunação, mas como algo coletivo, relativo. A mulher a quem somos remetidos quando usamos a palavra ‘importunar’, ou ‘importunação’, confronta o juiz iníquo, e ela representa a Igreja. O comentário de Cristo sobre esta palavra foi: “Não fará Deus justiça aos seus escolhidos, que a ele clamam dia e noite...” [Lc 18:7].
Qual é a justiça a ser feita a favor dos santos em suas adversidades? Bem, veremos esse fato coletivo no final, essa grande questão sendo resolvida quando o acusador dos irmãos for expulso, aquele que os acusava de dia e de noite diante de Deus. O grande Juiz fará justiça em relação ao acusador, o atormentador da Igreja, e isto tem seu aspecto coletivo.
O incidente do amigo inoportuno batendo à meia noite também é algo relativo, não apenas pessoal [Lc 11:5]. O homem se levantou porque seu amigo iria continuar batendo. O homem foi tirado da cama pela importunação do seu amigo, mas isto estava relacionado a outras pessoas. Tudo isto representa um esquema, um plano, uma campanha, na qual todo o povo do Senhor está envolvido. Deus não está apenas nos colocando individualmente numa posição, mas está nos colocando nessa posição relativa, junto com todo o Seu povo: “Até que todos cheguemos...” [Ef 4:13]. Nossas dores de parto ou treinamento moral, as contradições e demoras que nos atraem e nos levam a nos estendermos completamente sobre essas questões estão operando em nós, em relação ao Corpo. Tudo se torna em algo relativo, pois é do interesse do Corpo.
O Senhor busca aperfeiçoar todo o Seu Corpo, com a justa cooperação de cada parte. Um dia, o efeito cumulativo de nossas provações, dificuldades e perplexidades serão vistas no Corpo aperfeiçoado, e nós então iremos ver que nosso sofrimento não foi algo isolado, mas era coletivo, relacionado, fazendo parte do todo, e contribuiu para algo além dos nossos próprios interesses.
Precisamos permitir que o pleno propósito de Deus dê um colorido às nossas experiências pessoais. Isto pelo qual passamos não é simplesmente porque o Senhor nos marcou para sermos meros sofredores, mas acontece porque o Corpo todo é o Seu objetivo, e nós sofremos em relação a esse Corpo. Por causa do Corpo, nós preenchemos o que resta das aflições de Cristo. Os sofrimentos são relativos - correspondem à vontade relativa de Deus, não a absoluta - neste sentido mais amplo que eles se movem na direção do propósito pleno de Deus. Quando este propósito maior for alcançado, então, esta vontade relativa de Deus nos sofrimentos irá desaparecer, e não haverá mais dor, nem sofrimento. Precisamos enxergar o todo do plano de Deus e descobrir como a nossa persistência e importunação na oração afeta essas três coisas. A vida moral pessoal do cristão baseada num padrão celestial e o aumento do conhecimento espiritual estão por trás das demoras que nos conduzem à oração impertinente. Há algo novo que iremos conhecer como fruto de tudo isso. Iremos aprender algo que no momento é desconhecido para nós, e esta força que nos atrai é a maneira pela qual obtemos esse conhecimento.
Este exercício, essas dores de parto, estão relacionadas ao pleno propósito de Deus e se relacionam a todos os Seus santos. Não existe algo como coerção na vontade de Deus. Isto não corresponde à ideia de importunação. Importunação é cooperação com Deus, embora possa não parecer isso. Podemos achar que o seu efeito é o de coagir Deus e persuadi-Lo a fazer as coisas, mas Deus tem apenas nos atraído desta maneira para nos fazer cooperadores da Sua vontade. Isto é o que quis dizer quando disse que haviam coisas a serem vencidas em nós, e todos os tipos de coisas da velha criação precisarão ser subjugadas – nossos desejos, sentimentos, preferências, julgamentos, concepções, estimativas. No exercício, atividade e dores de parto da oração entramos em cooperação com Deus, e chegamos a ver, ao longo da caminhada, que aquilo que acreditávamos que era nossa tentativa de persuadir o Senhor a fazer as coisas, era de fato o Seu modo de nos fazer chegar à posição onde Ele pudesse fazer o que desejava. O Senhor tem caminhos estranhos, porém, no final Ele é justificado, e “a sabedoria é justificada por suas obras" [Mt 11:28].
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